Depois da pandemia, qual será o "novo normal" no setor automotivo?

Foco no digital, volumes mais baixos e maior diferença de preços entre novos e usados serão tendências

Fabricas passarão a adotar uma série de novos procedimentos e vão trabalhar com apenas um turno de produção com os altos estoques atuais
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Fabricas passarão a adotar uma série de novos procedimentos e vão trabalhar com apenas um turno de produção com os altos estoques atuais

Antes da pandemia, a indústria automotiva já estava passando pelo maior transformação da história desde o advento da linha de montagem, no início do século passado. Temas como eletrificação, compatilhamento e veículos autônomos estavam na ordem do dia. Agora, depois que o mundo foi abalado pelo novo coronavírus, começa uma nova revolução, mas com outros paradigmas. No caso do Brasil, a situação será ainda mais desafiadora. E como tudo isso vai ser sentido pelo consumidor final?

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Um ponto que é um consenso entre os analistas de mercado sobre o "novo normal " é a digitalização. Se antes da pandemia, as vendas online já eram uma tendência, neste momento, passaram a ser uma obrigação para sobreviver. De acordo com Ricardo Bonzo, CEO do site de vendas iCarros, que participou da Live #ABX20, “muita gente está esperando o mercado voltar ao normal, algo que não vai acontecer. Teremos um novo modo de se relacionar e de negociar”, avalia.

Ainda segindo o executivo, o desafio não é novo: “É um processo evolutivo normal. Dados do Google já mostram que os clientes, que no passado visitavam 5 a 7 lojas antes de comprar um carro , hoje vão a apenas 1,3”, diz. Ele também explica que “as pessoas já substituíram o passeio nas concessionárias pela pesquisa e negociação online. O desafio agora é encantar o cliente nesta nova plataforma.”

Um dado que vai ao encontro desse nova realidade é fornecida pela Bright Consulting, que informa, citando a Fenabrave (Federação dos Distribuidores de Veículos), que aproximadamente 30% das concessionárias não suportarão passar o mês de maio fechadas. Ou seja, sem adotar não apenas vendas, mas toda uma estratégia online, ficará impossível sobreviver às nova realidade do mercado.

Queda no preços dos usados 

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Grande ofertas de seminovos, inclusive nas locadoras, já está derrubando os preços em relação aos dos novos


Outro ponto importante enumerado pela consultoria é que mesmo com a lógica da crise nos direcionando a pensar que os consumidores irão procurar veículos de entrada, o perfil de compra no Brasil de hoje é completamente diferente daquele de 2013/2014. Em um mercado no qual a venda à pessoa física representou 1,2 milhão de veículos, o perfil do comprador de SUV e com “dinheiro na mão” deverá prevalecer.

Com a disparada do dólar e a alta pressão nos custos, os preços dos carros novos já estão aumentando. Isso vai gerar uma grande disparidade de valores em relação ao usados, transformados em caixa para pagar despesas e com preços despencando. Além disso, quase não existem mais ofertas de taxa zero.

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O que também vai contribuir para a queda no preços dos usados é o grande volume de devoluções dos veículos de locadoras. Conforme a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) esse número já chega a 160 mil. Portanto, as locadoras terão que acelerar as ações de redução de estoque e queda nos preços.

As lojas físicas que sobreviverem terão que ter custos pequenos e um formato bem diferente do tradicional. Além das "pop-up stores" que são montadas e desmontadas em locais estratégicos por períodos curtos, as novas concessionárias terão que seguir o padrão que começou a ser adotado pela Volkswagen no final de 2018, com uma série de recursos que permitem não apenas customizar o carro e ter a sensação de estar dentro dele com ajuda e óculos de realidade virtual .

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Lojas menores e com recursos digitais vão ocupar o lugar das tradicionais, que tendem a desaparecer rapidamente


Além disso, as lojas passarão a ser mais flexíveis, enxutas (a partir de 90 m², ante 300 m² anteriormente) e com espaços de convivência, respeitando a distância segura entre as pessoas. Em tótens com tablet , clientes e vendedores poderão pesquisar todos os detalhes e diferenciais dos veículos, condições de compra e financiamento no aplicativo. E como o custo de implantação de uma concessionária será menor, poderá ser possível haver pontos em mais nobres e altamente valorizadas.

Os consumidores também sentirão diferença na questão da higienização dos carros. A FCA, por exemplo, vai trazer aparelhos que fazem a limpeza do interior com ozônio e ultravioleta. Segundo o diretor da Mopar América Latina, Luis Santamaria, a novidade logo vai estar disponível no mercado e que a empresa trabalha para que chegue com o preço adequado como parte da gama de acessórios disponíveis.

Com a pandemia do novo coronavírus, a demanda por produtos e procedimentos de higienização está aumentando e marcas como Fiat e Jeep estão atentas a esse movimento. Conforme Santamaria, os equipamentos são ligados no próprio carro. O modelo que faz oxi-sanitização deve estar à venda até o começo do terceiro trimestre, mas ainda não há preço definido.

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O futuro incerto do Salão do Automóvel e dos carros compatilhados também serão mudanças importantes daqui para frente, de acordo com especialistas do setor automotivo. Além disso, pelo menos no Brasil, a chegada de mais modelos elétricos e híbridos vai demorar mais, entre outros fatores, pelo alto preço. E os autônomos ficaram ainda mais inviáveis em tempos tão bicudos tanto para fabricantes quanto para os consumidores com rendas reduzidas, todos com a necessidade de se adaptar ao " novo normal ".