Motores de três cilindros: o preço da vibração no downsizing

Engenheiro do Instituto de Tecnologia de Propulsão (ITP) explica os prós e contras dos motores de três cilindros que equivam vários modelos atuais

Um dos motores de três cilindros disponíveis atualmente nos modelos vendidos no Brasil é o 1.0, da linha Ka
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Um dos motores de três cilindros disponíveis atualmente nos modelos vendidos no Brasil é o 1.0, da linha Ka

“Gosto muito do desempenho do meu motor de três cilindros. No entanto, observo uma vibração e um ruído que não observava em meu motor anterior de quatro cilindros. Tenho a impressão de que está com um cilindro falhando. Seria este o preço do downsizing?”

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 Esta é uma observação comum dos proprietários de veículos equipados com as novas gerações de motores de três cilindros que invadiram o mercado nacional. Neste contexto, podemos citar VW Up, Hyundai HB20 e Ford Fiesta.

 A tendência pela redução do tamanho dos motores de combustão interna e a adoção dos motores de três cilindros não é nova. A indústria automobilística mundial encontrou esta alternativa como um meio de reduzir o consumo de combustível e, consequentemente, a redução das emissões de CO2 na atmosfera.

 Motores equipados com três cilindros e 1.0 litro de cilindrada dispõem de menos componentes submetidos a atrito, menos área para perda de calor e, também, aumento da eficiência térmica e redução das perdas por bombeamento. Estes recursos tecnológicos associados a aplicação de turbo compressores e utilização de variadores de fase de abertura de válvulas, entre outros artifícios, garantem desempenhos dignos de motores de maior porte, com o dobro de cilindrada.

O lado ruim dos três cilindros

 No entanto “nem tudo são flores”. A abdicação de um cilindro “cobra seu preço”. Para entendermos o fenômeno de vibração presente nos motores de três cilindros, temos que voltar ao principio de funcionamento dos motores de quatro cilindros.

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Pistões dos motores de três cilindros, que costumam vibrar em funcionamento

 Motores de três cilindros não possuem pistões deslocando-se de forma conjunta. Cada pistão chega ao ponto morto inferior e ao ponto morto superior de forma individualizada (vide foto ao lado). Isto por si só já promove certa instabilidade rotacional. Mas o fato realmente relevante é que a combustão não iniciará em um cilindro vizinho após o término do processo de combustão que está em andamento. Este fato é compreensível visto que sabemos que um curso de combustão dura 180º de ângulo do virabrequim.  E este é o intervalo de combustão de um motor de quatro cilindros (720°÷4=180º).

No entanto, o intervalo de combustão de um motor de três cilindros é de 240º de ângulo do virabrequim (720°÷3=240º). Visto que a combustão tem duração de 180º de ângulo do virabrequim, em um motor de três cilindros existe um espaço vazio de 60º sem a aplicação de energia proveniente da combustão ao sistema, até que o próximo pistão esteja em posição para o inicio da combustão (240º - 180º = 60º). Este é o motivo principal da ocorrência de vibração e ruído tão reclamado pelo cliente deste segmento.

 Logicamente, existem alternativas para minimização deste incomodo. A utilização de um eixo balanceador acoplado ao virabrequim é a mais eficiente. Porém, boa parte das fabricantes  não está disposta a adicionar este componente ao custo de produção. Alternativas de custo reduzido como: balanceamento da árvore de manivelas, recalibração de coxins de sustentação e adoção de massas devidamente posicionadas ao volante do motor já são práticas utilizadas por algumas marcas para atenuar esta característica.

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Entretanto, a redução do tamanho dos motores se faz necessário para o atendimento das normas de emissões de poluentes cada vez mais rígidas. Contudo, a presença de certa medida de vibração nos motores de três cilindros parece ser um preço que o consumidor terá que pagar até que as montadoras decidam investir em tecnologias mais eficientes para atenuar esta característica.

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O engenheiro Marcelo Valerio dos Santos faz parte do Instituto de Tecnologia de Propulsão

Marcelo Valério dos Santos é Pós Graduado em Engenharia  Automobilística e Mestre em Projeto Mecânico. Atuou durante 32  anos na área de Desenvolvimento de Motores. Faz parte do quadro de  docentes do Instituto de Tecnologia de Propulsão (ITP).