
A reinvenção da Renault
SUV médio Boreal reforça a ideia de sofisticar a imagem da marca no Brasil
por Eduardo Rocha
Auto Press
O cobertor é curto para todo mundo. Escolher um alvo específico significa que outros alvos se tornarão secundários. Um exemplo: se uma marca se sofistica, a tendência é que atinja um público menor. É o caso da Renault, que busca se afirmar como marca semipremium, em um movimento iniciado no Brasil com o Kardian e segue agora com o Boreal. Trata-se do primeiro SUV médio da marca francesa nos quase 40 anos de mercado brasileiro. A briga aqui será com Volkswagen Taos, Toyota Corolla Cross e Jeep Compass, sendo que a principal arma não será o preço, mas a tecnologia, o requinte e o design, itens que deixam o Boreal em vantagem nesse momento.
O Boreal chega às concessionárias no dia 19 de novembro em três versões: Evolution a R$ 179.990, Techno a R$ 199.990 e Iconic a R$ 214.990, valores de lançamento que devem sofrer um aumento de cerca de 5% após esta primeira fornada. Dessa forma, o SUV da Renault ficará mais alinhado aos rivais em conteúdo e preço.
Assim como o Kardian, que também faz parte do projeto Renaulution, o Boreal recupera a tradição da marca de ousar no design. As linhas são entalhadas, com nervuras bem acentuadas no capô e a frente com a grade bastante trabalhada. O aspecto geral é feroz e ele ostenta o novo tratamento da logomarca, em aço escovado. As laterais e traseira fazem uma combinação bem encorpada, com linhas cinzeladas. Na coluna traseira, há um acabamento em alumínio com trama geométrica. Conceitualmente, fica em um plano intermediário entre o estilo raiz do Compass e o crossover do Corolla Cross.
Como a ideia é refinar a marca, o Boreal chega com bom nível de equipamentos já na versão de entrada. A Evolution vem com rodas aro 18, painel digital de 7 polegadas e multimídia de 10 polegadas, ar digital duplo, carregador por indução, freio de estacionamento elétrico, revestimento em couro, sensor de luz e chuva e pacote ADAS básico, com controle de cruzeiro adaptativo, alerta de colisão, frenagem autônoma e monitoramento de faixa.
A intermediária Techno acrescenta farol de neblina, rodas aro 18 diamantadas, painel de 10 polegadas, sistema operacional Google built-in, conexão com aplicativo MyRenault com funções remotas, luz interna configurável em 48 cores, bancos dianteiros com ajustes elétricos e pacote ADAS com 19 recursos, como sensor dianteiro e de ponto cego.
A top Iconic adiciona rodas aro 19, pintura em duas cores, sistema de áudio da Harman Kardon, acabamento em revestimento azul (deep blue), teto solar panorâmico, movimentação elétrica da tampa do porta-malas, encosto do banco do motorista com massagem e 24 recursos ADAS, incluindo estacionamento semiautomático e câmera 360º.
Todas as versões trazem sob o capô, o motor TCe 1.3T, desenvolvido em conjunto com a Mercedes-Benz, onde é conhecido como M282, mas com calibragens e periféricos específicos para cada marca. No Boreal, ele rende é gerenciado por um câmbio DCT, de dupla embreagem e seis marchas, e rende 156/163 cv de potência e 25,5/27,5 kgfm de torque, com etanol e gasolina. Nas versões Techno e Iconic, ele conta com cinco modos de condução: Eco, Confort, Sport, Perso e modo Smart, que atuam na calibração da direção, do motor e da transmissão (Fotos de Eduardo Rocha, Auto Press).
Ponto a ponto
Desempenho – O motor TCe 1.3 turbo de quatro cilindros se mostrou extremamente confiável desde sua estreia, em 2018, em modelos franceses da Renault. Ele tem recursos como corrente de comando metálica, dupla embreagem banhada a óleo, tem cilindros com revestimento pulverizado a plasma, de baixíssimo atrito. A ideia aqui é melhorar a eficiência e a performance. Com ele, o Boreal tem um comportamento liso e a sensação é de estar com o motor sempre cheio. Apenas nas solicitações muito repentinas e agressivas percebe-se um pequeno turbolag, que não aparece em uso normal. O torque máximo de 27,5 kgfm aparece aos 1.750 rpm e os 163 cv com etanol (156 cv com gasolina) geram uma relação peso/potência de 8,8 kg/cv na versão avaliada, a Iconic. A aceleração de zero a 100 km/h é feita em 9,5 segundos, com máxima limitada em 180 km/h. Nota 8.
Estabilidade – A Renault optou por suspensões McPherson na frente e eixo de torção na traseira. O sistema de eixo de torção é mais compacto e robusta, mas tem menor precisão. No entanto, funciona bem no Boreal, que adotou um ajuste intermediário, que se equilibra bem entre o conforto e controle de carroceira. Na prática, o conjunto absorve bem as irregularidades e tem rolagem lateral muito discreta. A direção é direta e firme em velocidades mais altas e bem leve nas manobras. Nota 8.
Interatividade – O painel digital de 10 polegadas da versão avaliada, Iconic, é bem informativo e tem grafismos atraentes e elegantes. Há ainda comandos indiretos para algumas funções – caso dos modos de condução. A central multimídia openR, de 10 polegadas, tem espelhamento de celulares sem fio simplificado e conta com sistema operacional Google built-in, conexão com aplicativo MyRenault com funções remotas. A versão conta ainda com câmera 360º e traz muitos recursos ADAS, que são efetivos e pouco invasivos. Nota 9.
Consumo – O Renault Boreal tem números ligeiramente melhores que seus principais rivais. Na cidade, conseguiu médias de 7,8 e 11,2 km/l e na estrada de 9,4 e 13,6 km/l, respectivamente com etanol e gasolina, com eficiência energética de 1,79 Mj/km, contra 1,81 de Taos e Corolla Cross e 1,97 do Compass. Esse desempenho rende nota A na categoria e C no geral. Nota 8.
Conforto – O Boreal tem uma rodagem lisa e suave, ajudada pela boa rigidez torcional da plataforma, avaliada em 35 kNm/º. A suspensão bem acertada filtra bem as pequenas irregularidades e resiste bem aos movimentos em buracos e desníveis. Os bancos são ergonômicos e o volante, o mesmo do Kardian, aqui tem um tamanho bem proporcionado. O isolamento acústico é bom em relação ao motor e à rolagem dos pneus, mas em velocidades em torno de 120 km/h, apresentou um discreto ruído aerodinâmico no retrovisor esquerdo, mas nada que impedisse uma conversa em tom normal. Nota 8.
Tecnologia – A arquitetura do Boreal é RGMP, Renault Group Modular Platform, é uma evolução da CMP-B, desenvolvida para aceitar projetos maiores – como a futura picape média, chamada provisoriamente de Niágara, e até modelos médios-grandes. Ela é moderna e foi projetada para aceitar motorizações híbridas – o que deve ocorrer em breve. O motor, por outro lado, é o ótimo TCe, desenvolvido juntamente com a Mercedes-Benz. O propulsor é acoplado a um câmbio de dupla embreagem banhado a óleo, mais resistente que os câmbios secos. Tem ainda painel digital, central multimídia versátil, serviços conectados e um bom pacote ADAS. Nota 9.
Habitabilidade – As medidas do Boreal são as maiores do segmento em comprimento, altura e entre-eixos (4,57 m, 1,65 m e 2,70 m, respectivamente), o que se reflete em uma área útil mais generosa. Com isso, há um ótimo espaço no habitáculo para pernas, cabeças e ombros. O console central elevado torna o uso cotidiano mais prático e traz um oportuno carregador por indução com resfriamento. O acesso ao interior é facilitado pela altura do veículo e o porta-malas, com 522 litros, é também o maior entre os rivais. Nota 9.
Acabamento – A ideia de sofisticar a imagem da marca se consolida no interior do Boreal. Os revestimentos são caprichados, com materiais requintados na qualidade e no aspecto. Caso das guarnições aplicadas no tablier, com tramas desenhadas a laser. As superfícies de toque são macias, algumas revestidas com couro sintético de boa qualidade, o design interno é elegante, com telas proporcionais e encaixadas em um console com moldura em preto brilhante. Nota 8.
Design – O Boreal tem traços entalhados com diversas referências ao losango da Renault, com linhas oblíquas em diversos pontos, como na grade, no acabamento na coluna traseira em alumínio, nas dobras dos para-choques, etc. Trata-se de um recurso de design que favorece a harmonia, o que causa boa impressão mesmo que não seja percebida objetivamente. Os volumes, com frente, cintura e traseira altas, dão um aspecto robusto, mantendo um certo refinamento. O resultado é um desenho original, equilibrado e atraente. Nota 9.
Custo/benefício – Nessa chegada no mercado, o Boreal está posicionado com preços ligeiramente abaixo em relação aos rivais diretos – o que deve mudar quando passar o período de lançamento. Ou seja: alinhado com Compass e Corolla Cross e abaixo do Taos. A ideia da Renault não é brigar com preço, mas se valer de ser o SUV médio mais moderno do segmento em relação a plataforma, tecnologia e motor. Nota 7.
Total – O Renault Boreal Iconic somou 83 pontos em 100 possíveis.
Impressões ao dirigir
Conjunto em harmonia
O Boreal encarna perfeitamente a imagem que a Renault busca construir no Brasil. Embora a gama da marca ainda preserve modelos da vida romena anterior, como Kwid e Duster, os novos SUVs feitos no Paraná são modernos e refinados o suficiente para requintar a marca. O design bem-esculpido, o bom conteúdo tecnológico, tanto em eletrônica quanto em motorização, coloca o Boreal como um concorrente efetivo entre os SUVs médios (a rigor, do segmento C-) com motor a explosão, chamados de ICE – internal combustion engine.
O motor de 156/163 cv turbo flex com injeção direta trabalha com um câmbio de dupla embreagem de seis marchas, que o deixa mais ágil do que na combinação apresentada no Duster, que usa câmbio CVT, que tem um mapeamento de motor próprio. Essa diferença faz com que o Boreal, mesmo maior e 80 kg mais pesado, seja mais econômico e acelere de zero a 100 km/h nos mesmos 9,5 segundos.
Mesmo sendo ágil, o Boreal apresenta um curto turbolag quando o acelerador é pressionado de forma abrupta. Em uso normal, as reações são diretas e controladas, mantendo uma suavidade que também reforça a ideia de refinamento. As suspensões também têm comportamento análogo: usadas no limite, compromete um pouco o conforto, mas em uso civilizado filtra bem as irregularidades e controla a carroceria com competência.
Por dentro, o acabamento é caprichado e o design é moderno e elegante. No lugar de uma tela com o tamanho de um monitor de desktop, a Renault optou por um conjunto que acopla o painel digital e a central multimídia, ambas com 10 polegadas na versão Iconic avaliada, discretamente voltada para o condutor. Aqui novamente aparece a ideia de luxo à francesa, que combina sofisticação com detalhes de diferenciação– como as guarnições no console frontal e nas portas e as formas geométricas que conversam bem com as linhas externas.
Mesmo sendo um carro novo, com aspecto original e inovador, o SUV da Renault se vale de usar elementos já testados, com a plataforma (usada no Kardian, mas evoluída a partir da CMF-B), o motor (desenvolvido com a Mercedes-Benz na década passada) e os sistemas ADAS com hardwares fornecidos por marcas consagradas, como ZF e Continental. Na junção disso tudo, a expectativa é que o Boreal seja um modelo confiável e capaz de conquistar a 2 mil unidades mensais emplacadas, esperadas nessa chegada.
Ficha técnica
Renault Boreal
Motor: Gasolina/etanol, transversal, dianteiro, com 1332 cm³, quatro cilindros em linha, quatro válvulas por cilindro, comando duplo no cabeçote com variação na admissão e no escape, com turbocompressor e injeção direta.
Transmissão: Automatizado de dupla embreagem banhada a óleo com seis marchas à frente e uma à ré. Tração dianteira.
Potência: 156 cv com gasolina e 163 cv com etanol a 5.250 rpm.
Torque: 27,5 kgfm com gasolina e etanol a 1.750 rpm.
Diâmetro X curso: 72,2 x 81,4 mm.
Taxa de compressão: 10,5:1.
Aceleração 0-100 km/h: 9,5 segundos.
Velocidade máxima: 180 km/h.
Carroceria: SUV médio com quatro portas e cinco lugares. Com 4,56 metros de comprimento, 1,84 m de largura, 1,65 m de altura e 2,70 m de distância entre-eixos. Altura mínima para o solo de 21,3 cm. Ângulo de 22,2º de ataque e de 26,6º de saída. Airbags frontais, laterais e de cortina de série.
Suspensão: Dianteira tipo McPherson com rodas independentes, molas helicoidais. Traseira com eixo de torção, rodas semi-independentes e molas helicoidais.
Freios: Dianteiro a disco ventilado. Traseiro a disco sólido. ABS com controle de partida em rampa, controle de estabilidade e frenagem automática de emergência.
Pneus: 225/55 R18 nas versões Evolution e Techno; 205/55 R19 na versão Iconic.
Peso: 1.388 kg (Evolution), 1423 kg (Techno) e 1.438 kg (Iconic).
Porta-malas: 522 litros.
Lançamento: novembro de 2025.
Capacidade do reservatório de combustível: 50 litros.
Produção: São José dos Pinhais, Paraná.
Preços: Evolution R$ 179.990; Techno R$ 199.990; Iconic R$ 214.990.