O presidente Lula durante a inauguração da nova linha de produção da Eletra
Ricardo Stuckert/PR - 02.06.23
O presidente Lula durante a inauguração da nova linha de produção da Eletra

Fala, galera. Beleza? Acredito que precisamos explorar cada vez mais as ações concretas em vez de planos e promessas, mas sem perder de vista o crescimento contínuo da mobilidade elétrica. O fato é que a maioria das pessoas, quando escuta falar de veículos elétricos, pensa em carros luxuosos.

Já falei algumas vezes que a ampliação da mobilidade elétrica não acontecerá de forma tão expressiva pelos veículos de passeio quanto será pelas frotas (transportes coletivos, logística, operacional e motoristas de app).

No dia dois de junho, o presidente Lula, acompanhado de diversos ministros e políticos locais, visitou a sede da Eletra, em São Bernardo do Campo (SP). A Eletra é uma empresa 100% nacional, fundada em 1999, com o intuito de produzir veículos que atendessem às demandas do século XXI.

Durante a visita, foi demonstrado de forma muito enfática a intenção do governo federal de incentivar as prefeituras a adquirirem veículos elétricos de produção nacional. Devemos ter orgulho desta marca, uma empresa de tecnologia nacional que também equipa seus modelos com componentes fornecidos por outra empresa brasileira, a WEG.

Atualmente, a Eletra fornece diversos modelos de ônibus e caminhões para empresas como Ambev, TransWolff, Protege, Metra, entre outras. Agora, com a nova sede, a capacidade de produção foi aumentada para 150 ônibus por mês. Aí que começa minha ponderação.

Muitas cidades brasileiras declararam a intenção de ampliar de forma expressiva a participação de veículos elétricos em suas frotas. A cidade de São Paulo, por exemplo, determinou por lei que os novos ônibus não poderão ser movidos à diesel. Além disso, estabeleceu a meta de atingir 20% da frota constituída por veículos 100% elétricos (tanto trólebus quanto a bateria).

Considerando que a frota atual possui 12.000 veículos, o objetivo é atingir 2.400 unidades 100% elétricas até 2024. A cidade possui, até o momento, 219 ônibus, apenas 9% do volume desejado. Se dependesse da produção exclusivamente da Eletra, a empresa precisaria de quase 15 meses para produzir a quantidade de veículos necessários para atender a cidade de São Paulo.

Diferentemente da maioria dos textos e matérias sobre o evento, o vídeo transmitido ao vivo deixou muito mais a impressão de protecionismo que incentivo às empresas nacionais. Frases como “não precisamos dos ônibus chineses”; “os ônibus chineses não aguentam a nossa infraestrutura” e “cabe ao estado brasileiro garantir a sobrevivência da indústria brasileira”.


Declarações como essas são mais prejudiciais do que benéficas para o desenvolvimento da mobilidade elétrica, visto que cria uma defesa exacerbada, reduz a competitividade e limita a oferta de opções. Diria mais, consideraria as declarações xenófobas. Além disso, não há como imaginar hoje em dia a mobilidade elétrica sem a contribuição de empresas chinesas como a BYD, JAC, XCMG e Higer.

Mesmo que as empresas citadas decidam produzir seus veículos em território brasileiro, ainda sim serão empresas chinesas, com projetos, tecnologias e componentes chineses. Também não podemos excluir o gigantesco potencial de produção em larga escala que as empresas citadas e tantas outras possuem para suprir a demanda cada vez maior que cidades como Curitiba, Salvador, São José do Campos, São Paulo e Rio de Janeiro trazem.

Não entendam que sou contra a produção local, pelo contrário, desejo ver outras empresas com a Eletra, FNM e Arrow crescendo de tal forma que atendam as demandas nacionais e ainda tenham capacidade de exportação.

Mas limitar o incentivo de aquisição apenas de empresas nacionais atrasaria a expansão da mobilidade elétrica de forma considerável por conta da capacidade de produção que ainda precisa ser ampliada. Sem contar que atrasaria o desenvolvimento de novas tecnologias e encareceria o produto simplesmente por falta de competitividade. Pensem como pode ser potencialmente prejudicial para as empresas nacionais esse protecionismo injustificado.

O Brasil já teve a sua fase de protecionismo às empresas nacionais e isso gerou décadas de atraso. Infelizmente, o evento de inauguração da nova fábrica foi apenas mais um indício que o país pode estar caminhando em uma direção equivocada quanto à mobilidade.

Anteriormente, dei minha opinião sobre o incentivo prometido pelo Governo Federal para a popularização dos veículos . Da mesma forma, penso que são medidas equivocadas e com baixo potencial de beneficiar o público-alvo declarado.

Apenas para concluir, entendo que projetos que auxiliem a troca dos atuais veículos a diesel por veículos elétricos e o desenvolvimento da infraestrutura de recarga, não é só bem-vindo como fundamental. Entretanto, não podemos usar a mobilidade elétrica simplesmente como mais uma oportunidade de geração de empregos.

A mobilidade elétrica é capaz de muito mais: melhorar a qualidade de vida nas cidades, reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, aumentar a eficiência e lucratividade das operações e ainda gerar uma nova cadeia de empregos. Mas tudo isso só será possível se proporcionarmos o espaço para que a mobilidade elétrica se desenvolva sem amarras.

Até mais.

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