
O reaproveitamento de baterias de veículos elétricos para uso em sistemas estacionários (instalações fixas que armazenam energia para uso posterior) apresenta riscos graves de segurança, como incêndios e superaquecimento, além de enfrentar obstáculos técnicos e falta de padronização, segundo o engenheiro elétrico Raphael Alves, em entrevista ao Portal iG Carros.
A prática, vista como alternativa sustentável para ampliar a vida útil das baterias, esbarra em desafios como a ausência de dados históricos confiáveis, diferenças entre tecnologias e a necessidade de adaptações estruturais em sistemas domésticos e comerciais.
O fato
Entre os principais riscos do reaproveitamento, o engenheiro destaca o potencial de "thermal runaway", situação em que as células da bateria entram em colapso ao atingir entre 150 °C e 200 °C.
“Isso é crítico em ambientes residenciais e comerciais”, afirmou Raphael Alves.
Além disso, o desbalanceamento das células, que é o resultado da degradação desigual durante o uso, dificulta o controle seguro das cargas e descargas.
A ausência de dados históricos sobre o uso anterior da bateria, especialmente quando não há acesso ao sistema de gerenciamento original (BMS), também compromete a avaliação do estado real de saúde das células.
"Sem esses dados, não se sabe o quanto a bateria foi exigida ou degradada", diz o engenheiro.
O funcionamento e os entraves técnicos

As barreiras para a padronização incluem as diferenças entre montadoras, tipos de células (cilíndricas, prismáticas ou pouch), conectores e protocolos de comunicação. Isso torna a reutilização em larga escala um desafio técnico.
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Para diminuir esses problemas, a engenharia pode desenvolver sistemas modulares e universais, kits de reaproveitamento “plug and play” e aplicar engenharia reversa em projetos de retrofit.
Raphael Alves defende também a criação de normas técnicas por instituições reguladoras para que as baterias já sejam pensadas com uma “segunda vida” desde a concepção.
Outra questão é a refrigeração. Os sistemas térmicos dos veículos não são feitos para operação estacionária.
"Se não forem adaptados, o risco de superaquecimento aumenta", afirma.
Aplicações e durabilidade
Apesar dos desafios, o uso estacionário pode garantir sobrevida significativa às baterias.
Segundo o engenheiro, muitas são descartadas ainda com 70% a 80% da capacidade original, o que permite seu uso por até 10 anos em aplicações de menor exigência.
Entre os fatores que mais influenciam essa durabilidade estão: o estado de saúde no momento da conversão, a presença de controle térmico, a gestão eficiente dos ciclos de carga/descarga (mantendo-se entre 20% e 80%) e a qualidade da reconfiguração.
“Baterias testadas célula a célula e recondicionadas com BMS modernos têm maior chance de durar”, explica.
O tipo de uso também conta: sistemas intermitentes, como backups e armazenamento solar, desgastam menos as células do que aplicações com ciclos diários completos.