Com a aprovação do Rota 2030, os brasileiros podem novamente sonhar em aderir à moda mundial dos carros elétricos. Mas há algo muito mais profundo nessa mudança, que pode ir além de simplesmente substituir um motor a combustão por outra unidade sustentável. Os especialistas dizem que, para entrar de vez no futuro, as pessoas de todo o mundo precisarão se dissociar do impulso de necessariamente ter um automóvel na garagem. O Salão de Veículos Elétricos, que aconteceu em São Paulo entre os dias 17 e 19 de setembro, apresentou algumas resoluções interessantes sobre o que podemos esperar sobre o futuro.
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“O Rota 2030 é uma medida que influencia no imposto sobre o veículo elétrico”, diz Ricardo Takahira, diretor da Associação Brasileira de Veículos Elétricos. “Essa não será a única resolução sobre o assunto, uma vez que o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio pretende apresentar uma publicação específica sobre um Plano Nacional de Eletromobilidade até o fim do ano, como disse o próprio Ricardo Zomer, do Departamento de Mobilidade e Logística (integrado ao Ministério) no Salão de Veículos Elétricos ”, disse Takahira.
Portanto, podemos esperar por resoluções do Governo Federal que tratem especificamente da viabilização de veículos híbridos e elétricos, indo além do programa Rota 2030. “É um programa que ainda precisa ser trabalhado, mas que trará benefícios não apenas para a mobilidade urbana, mas também para emissões de gases”, continua Takahira.
Este é um ponto importante que também foi abordado durante o Salão de Veículos Elétricos. Se a energia que parte da sua tomada e abastece a bateria do carro elétrico veio de uma Usina Hidrelétrica, o proprietário não estará isento dos diversos impactos ambientais que uma estrutura do tipo proporciona. Não será como dirigir um carro que é 100% limpo, uma vez que os impactos de uma hidrelétrica são irreversíveis para o ecossistema, de acordo com especialistas.
A Fronius, grupo austríaco que trabalha com baterias e receptores de energia solar, também marcou presença no evento, apresentando soluções mais sustentáveis para empresas e residências converterem a luz do sol em energia para o abastecimento de veículos elétricos. Essa é a única forma 100% limpa de circular com veículos elétricos, ainda que a captação de energia solar esteja engatinhando no Brasil.
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“O petróleo é um recurso finito”, continua Takahira. “Muito se fala sobre veículos elétricos como alternativas sustentáveis para a cidade, mas isso também é possível em plantações. Substituir o trator movido a combustível fóssil por um modelo eletrificado é uma boa alternativa para não contaminar o meio-ambiente”.
De acordo com a ONG Observatório do Clima, a emissão de gases tóxicos responsáveis pelo efeito estufa teve o maior crescimento em treze anos, apenas no período entre 2015 e 2016. Nos últimos dois anos, foram 2,6 milhões de toneladas de CO2 enviados à atmosfera apenas no Brasil.
Enquanto colheitadeiras e caminhonetes de fazendeiros ainda não aderiram à tecnologia elétrica e híbrida, marcas começam a apostar cada vez mais na categoria no Brasil. A Toyota já está testando o Prius flex, o primeiro carro do mundo a beber gasolina e etanol, há um certo tempo. O projeto conduzido pela marca tem fortes raízes tupiniquins, uma vez que toda a adaptação de dutos e motor está sendo feita pelo time brasileiro de engenharia.
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A Volvo também marcou presença no evento, colocando a variante híbrida do grande XC90 à disposição do público para um pequeno test-drive. A atual família de motores da marca sueca é a última feita com motores essencialmente a combustão. A partir da metade da próxima década, todos os carros da Volvo serão no mínimo híbridos.
Alguns carros elétricos já passaram pela nossa redação, como Chevrolet Bolt EV e o BMW i3 . Tivemos a oportunidade de dirigir um Renault Zoe por um curtíssimo trajeto, comprovando a eficácia de um carro elétrico europeu de baixo custo. No velho continente, o Zoe custa o mesmo que um Clio; ou seja, ao menos por lá, ter um veículo elétrico passa longe de ser uma realidade dos ricos.
Salão de Veículos Elétricos: o caso Zoe
O Zoe é um veículo simples e apertado, na mesma filosofia dos subcompactos que visam mais a funcionalidade que qualquer outra característica. Quatro adultos e uma criança se acomodam com certo desconforto, principalmente no espaço para os joelhos. A direção macia ajuda nas manobras mais complicadas, contando ainda com uma boa central multimídia com câmera de ré.
Se você ainda não foi apresentado ao mundo dos carros elétricos, poderá se surpreender com o fato de que eles não fazem barulho. Como não há uma queima de energia através de combustão acontecendo abaixo do capô, o Zoe fica restrito a apenas um leve zunido agudo e futurista. O redondinho produz espertos 95 cv de potência que são entregues com toda disposição. Este é um dos motivos da eletrificação ter atingido também o mundo dos superesportivos, como o Acura NSX.
Carros elétricos não têm um conta-giros como o seu modelo convencional. Sabe quando falamos que o torque máximo é entregue a 2.500 rpm? É o tanto que o motor do seu carro precisa trabalhar para entregar toda a sua força. Um modelo elétrico, por outro lado, tem 100% de sua força a “zero giros”.
O Zoe responde muito bem às provocações. Longe de ser vendido no Brasil, seria uma boa alternativa para o futuro. Se é que as pessoas continuarão tendo carro nas próximas décadas. No começo de setembro, o Denatran publicou o levantamento de que a emissão de CNHs para jovens entre 18 e 21 anos caiu 20,61% nos últimos três anos. Foram 939 mil documentos em 2017, ante 1,2 milhão em 2014.
Talvez as fabricantes estejam puxando os cabelos, mas os especialistas em veículos elétricos estão confiantes sobre um novo fenômeno que está começando a surgir no Brasil: os aplicativos de carona. Carros ocupam um espaço muito precioso nas grandes cidades e os estacionamentos ficam cada vez mais apertados. Quando de Uber, 99 e Cabify entrarem no mundo da eletrificação, poderemos ter um cenário ainda mais sustentável na otimização de espaço.
“Acho que os brasileiros ainda sentem receio de comprar um carro elétrico, principalmente por conta da autonomia”, diz Takahari. “Apenas a estruturação poderá nos ajudar a percorrer o caminho da confiança. Os modelos elétricos estão atrelados ao modelo de negócio que chamamos de Mobility as a Service ( mobilidade como serviço), onde eliminamos o conceito de posse para utilizar o transporte simplesmente como um recurso móvel”.
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São vários os obstáculos até a consagração dos eletrificados no Brasil, mas o Salão de Veículos Elétricos mostrou um panorama muito mais inteligente e confiável sobre o futuro. Enquanto uma geração que já não faz mais questão de ter um carro próprio toma conta do mundo, a eletrificação e automação traçam o caminho para um uso mais sustentável e eficiente.