
O Brasil tem potencial para liderar a produção de hidrogênio verde, mas ainda enfrenta entraves regulatórios e de infraestrutura.
A aposta no etanol como fonte para gerar H² pode oferecer vantagens competitivas, segundo Raphael Diniz, coordenador global de produtos para atmosferas explosivas na Schmersal Brasil, em entrevista ao iG Carros.
Com matriz elétrica renovável e logística consolidada de biocombustíveis, o país pode unir vantagens tecnológicas e geográficas para avançar na nova economia do hidrogênio.
O cenário atual e os desafios
O hidrogênio verde ainda está em fase inicial no Brasil. De acordo com Diniz, atualmente há diversos memorandos de entendimento assinados, com destaque para os hubs no Ceará, Bahia e Pernambuco.
Apesar disso, ele ressalta que “nenhuma planta de produção de hidrogênio verde em escala comercial está operando ainda”.
A localização estratégica próxima à Europa e aos Estados Unidos e a disponibilidade de energia renovável reforçam a competitividade brasileira.
No entanto, a previsão da BloombergNEF de reduzir o custo do hidrogênio para US$ 1,45/kg (R$ 8,15/kg na cotação atual) até 2030 depende de investimentos e regulação.
“Hoje, o custo médio global do hidrogênio verde ainda gira em torno de US$ 6,00/kg (R$ 33,7/kg)”, disse.
O país aprovou em 2024 a Lei nº 14.948, que criou o marco legal do hidrogênio.
Para Diniz, ainda faltam incentivos fiscais e tarifas diferenciadas para consumo de energia renovável.
“É urgente regulamentar aspectos operacionais da lei e fomentar a nacionalização de componentes críticos”, destacou.
O etanol como rota alternativa
O uso do etanol para gerar hidrogênio é baseado na reforma a vapor. O especialista diz que nesse método o etanol reage com vapor d’água, produzindo hidrogênio e dióxido de carbono biogênico, o que torna o processo neutro em carbono.
Entre as vantagens dessa rota estão a descentralização da produção e a infraestrutura já existente.
“O hidrogênio pode ser gerado em postos de abastecimento ou até mesmo embarcado em veículos, eliminando a necessidade de transporte e armazenamento de H² sob alta pressão ou em forma líquida."
Testes recentes com o Toyota Mirai validaram a tecnologia. O hidrogênio produzido a partir de etanol atingiu a pureza exigida e garantiu emissões líquidas de carbono próximas de zero.
Infraestrutura e perspectivas de mercado
Apesar do potencial, gargalos logísticos ainda limitam o setor.
“Produção, armazenamento, transporte, distribuição e regulação. Embora o país tenha alto potencial renovável, ainda faltam estruturas consolidadas para viabilizar o hidrogênio em escala industrial ou veicular”, avaliou Diniz.
A adoção deve começar em transporte público e logística de curta distância, onde há rotas fixas e abastecimento centralizado. Para ele, a rota do etanol pode reposicionar a indústria automotiva nacional.
Ela permite o uso de uma infraestrutura já consolidada, como a rede de distribuição de etanol e a experiência em veículos flex, para alimentar veículos elétricos com célula a combustível, por meio de reformadores embarcados ou estações descentralizadas.
Pesquisa e inovação como eixos de avanço
Universidades como USP e centros como o IPEN e ITA têm papel fundamental.
“Eles desenvolvem novos processos e sistemas de armazenamento e testam tecnologias em plantas-piloto”, explicou Diniz.
Projetos como a planta da Neoenergia em Pernambuco, que produz hidrogênio verde com energia solar, ajudam a validar custos e operações em escala reduzida.
“Iniciativas de vanguarda como essa precisam ser fomentadas para que possamos seguir nessa trilha”, disse.
Diniz ainda diz que acredita que o Brasil pode se tornar exportador relevante com portos localizados em partes estratégicas para chegar à Europa e aos Estados Unidos.
“A ampla disponibilidade de fontes renováveis permite a produção de H2 com um dos menores custos globais projetados para a próxima década” , afirmou.