Quem lê revistas de carros desde os anos 80 deve se lembrar que, naquela época, uma simples reestilização era festejada, ia para a capa e ganhava uma reportagem de muitas, muitas páginas. Eram tempos em que o mercado brasileiro estava fechado para importações. Tempos em que apenas quatro montadoras davam as cartas, salvo alguns fabricantes de modelos fora-de- série. Grandes lançamentos eram raríssimos.
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Pois bem, esses tempos não voltam mais, já que temos quase duas dezenas de marcas produzindo localmente. Mas teremos algo um pouco parecido com os anos 80 nos próximos anos. A lista de lançamentos nacionais será bem menos extensa do que foi recentemente. Por um bom tempo, teremos uma entressafra com estreias pontuais e muitas variações sobre o mesmo tema, ou seja, reestilizações leves e tentativas de valorizar meras mudanças de ano-modelo.
Por que isso? Simples. Desde que a crise político-econômica se instalou no país, ainda no primeiro governo Dilma, os números de vendas vêm despencando, e isso já tem quatro anos. A leve queda de 2013 parecia só um susto, mas a partir de 2014 a situação degringolou, e as montadoras puxaram o freio de mão.
Mas por que, afinal, tivemos tantos lançamentos nos últimos anos? Porque é difícil abortar um processo como um lançamento de um carro todo novo, que começa pelo menos quatro anos antes de sua chegada às lojas. O que está sendo lançado hoje teve o martelo batido em 2013.
Neste ano ainda teremos lançamentos importantes, como o Fiat Argo, hatch compacto feito em Betim (MG), e o Renault Kwid, minicarro com jeito de SUV feito em São José dos Pinhais (PR). Mas não se iluda, meu caro leitor. O ano que vem já será de vacas magras, infelizmente.
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Claro que há a exceção que confirma a regra. A Volkswagen, outrora líder, está investindo para recuperar terreno, em pleno ciclo de lançamentos globais. Nem a crise vai impedir que ela comece a produzir aqui, no próximo ano, o novo Polo e sua versão sedã, o Virtus. E logo depois, uma derivação SUV.
E as outras marcas?
A GM, líder do mercado, só deve renovar sua linha compacta na próxima década. Antes disso vem o SUV médio Chevrolet Equinox, mas feito no México. A Fiat terá na virada do ano a versão sedã do Argo, mas ela virá da Argentina. Já a Ford terá reestilizações, começando pelo EcoSport este ano, mas nada de tão novo antes de 2020.
As marcas japonesas são ainda mais cautelosas, vide o caso da Honda, que tem uma segunda fábrica prontinha em Itirapina (SP), mas que só vai começar a operar quando o mercado reagir. A Toyota flerta com a ideia de produzir aqui o CH-R, um SUV que está mais para médio do que compacto. Mas não aposte nele para esta década. E a Nissan vai nacionalizar em breve o SUV Kicks, hoje importado do México, e nada mais no horizonte próximo.
Até marcas conhecidas pela ousadia, como a coreana Hyundai, estão cautelosas em relação ao potencial do mercado brasileiro. A picape Creta STC, exibida no último Salão do Automóvel, está na geladeira, apesar dos ótimos números de venda de sua inspiração, a Fiat Toro. Já mostramos aqui em Autobuzz que a Hyundai roda pelo país com duas unidades do pequeno Kia Picanto, em estudos para desenvolver um Hyundai menor que o HB20 (ela é dona da Kia). Mas os planos ainda dependem de um grande investimento na ampliação da fábrica em Piracicaba (SP), ainda não liberado pela matriz.
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Não espere também por grandes movimentações da dupla francesa Peugeot-Citroën, muito menos das marcas premium que se instalaram recentemente no pais, como Land Rover, Jeepou o trio alemão Audi, BMW e Mercedes. Espere, sim, muitas novidades importadas, para compensar a lacuna de novidades nacionais. Sobretudo de marcas hoje prejudicadas pelo super-IPÌ de 30 pontos porcentuais. Esse castigo acabará na virada do ano, favorecendo sobretudo as chinesas e a coreana Kia.
Mas quando afinal as montadoras vão destravar o freio de mão?Isso depende de dois fatores. O primeiro, mais óbvio, é a recuperação das vendas aguardada ansiosamente para o ano que vem. O segundo, igualmente importante, é novo programa automotivo em gestação, para o lugar do Inovar-Auto. Batizado de Rota 2030, ele tem um perfil de longo prazo e de menos protecionismo que o Inovar. Por isso mesmo, espera-se um período de adequação de quatro anos para as novas regras, assim que entrarem em vigor. Ou seja: o ritmo alucinante de lançamentos que tivemos nos últimos anos só deverá ser retomado em... 2022. Com muitas variáveis no meio dessa longa rota de recuperação.
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