No mundo do automóvel, a palavra customização (do inglês custom, personalizado) está fortemente associada a acessórios que deixam o carro ao gosto do consumidor. Existe até uma feira anual gigantesca em Las Vegas sobre o tema, o SEMA Show. Com acessórios de todos os tipos, o cliente pode deixar o carro mais esportivo, mais off-road, mais confortável, mais conectado, mais chamativo, ou até transformá-lo numa caixa acústica, para quem gosta de música. Mas num futuro próximo, a customização vai superar as barreiras do carro próprio e vai migrar para os serviços de mobilidade.
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Cada vez mais, o carro próprio customizado será uma exótica exceção. E o uso do carro de forma customizada será o segredo para quem ainda quiser fazer dinheiro no setor automotivo. O lucro das empresas será medido por quilômetros rodados e serviços prestados para a mobilidade , não mais por carros vendidos. E as feiras de negócios (Business to Business) serão mais importantes do que os tradicionais Salões do Automóvel (Business to Consumer).
Em resumo, o futuro pertence a quem criar o Netflix dos carros, o Spotfy automotivo, o Airbnb sobre rodas, o Booking.com dos viajantes motorizados. Se o Netflix revolucionou o consumo de filmes e seriados, Deezer e Spotfy mudaram a forma de consumir música e aplicativos de viagem quebraram as agências de turismo, o mesmo está para acontecer na forma como nos relacionamos com a mobilidade individual. Ele será totalmente customizada, personalizada.
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E o que seria essa customização da mobilidade? Simples. O cliente só vai ter um carro próprio se fizer muita questão ou tiver muita necessidade. Mas se não quiser, poderá usar serviços que lhe propiciem ter um carro onde e quando quiser. Pelo tempo que for necessário. E o tipo de carro que for mais adequado a cada ocasião. “Mas isso já não existe com a possibilidade de aluguel de carro?”, você pode me perguntar. Em termos. O que estou propondo seria um avanço enorme no conceito de aluguel de carro, hoje um serviço caro, com limitações de escolha do modelo, de onde retirar, de onde devolver.
O que o futuro reserva é a livre escolha do cliente. Fulano pode querer andar de transporte público e aplicativos durante a semana, mas ter um carro disponível apenas em finais de semana. E o tipo de carro pode variar conforme a ocasião – de um casamento bacana em sua cidade a uma viagem que inclua trechos de terra. O carro necessário seria entregue e devolvido nos locais e horários de sua escolha. Até na porta da sua casa, dependendo do seu plano personalizado.
Ciclano pode querer usar um carro compacto e econômico apenas para os dias de semana. Beltrano pode querer carros específicos apenas para períodos de descanso (feriados e férias). Fulana pode querer um carro com motorista nos dias de semana, para ir trabalhando no trânsito, mas o mesmo carro sem motorista para os finais de semana. Já Herculana pode querer um carro esperando por ela no aeroporto a cada viagem que fizer, não importa o país. O que fará pouco sentido é ter um carro próprio que passa quase todo o dia estacionado.
As demandas serão as mais variadas. Mas quem oferecerá um serviço tão customizado? Qualquer empresa do mundo automotivo que quiser sobreviver no futuro. Estou falando se uma espécie de serviço de assinatura de automóvel. Mobilidade sob demanda. Ao mesmo tempo uma ameaça e uma oportunidade para marcas generalistas e especialistas.
Um cliente poderia comprar um serviço de assinatura, digamos, da Chevrolet (só para citar a atual líder de vendas), com vários pacotes negociáveis à sua escolha. Tendo o tipo de carro que quiser do portfólio da marca, onde, quando e por quanto tempo for necessário. Com ou sem motorista. Já uma marca especialista como a Jeep ou a Land Rover poderia ter planos para clientes em locais onde um 4x4 se faz necessário.
Futuro brilhante
Mas os serviços de mobilidade customizada serão disputados não apenas pelas montadoras que sobreviverem nesse futuro disruptivo, que incluirá carros elétricos, híbridos e com diferentes graus de condução autônoma. Grandes locadoras de hoje poderão se transformar em grandes plataformas de serviço de mobilidade customizada. Até empresas como o Uber e afins poderão entrar nesse segmento. Ou mesmo gigantes do mundo online, como Airbnb, Decolar, Submarino... Isso sem falar de novos entrantes, por que não? Certos fabricantes de carros poderão optar apenas por fornecer produtos a empresas mais especializadas nessa complexa logística de satisfazer às necessidades pontuais de cada consumidor.
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E as concessionárias, como ficam nessa história? Elas serão um mix de administradora de frotas e de locadora de veículos. Terão mais assistentes de serviços personalizados do que vendedores. Não terão mais áreas para vender financiamentos ou seguros, e sim para oferecer planos de mobilidade. Terão mais entregadores/buscadores de carros do que mecânicos. Aliás, a assistência técnica das frotas será terceirizada, não fará parte da expertise desses dealers do futuro.
O fato é que, em algumas décadas, ter um carro próprio será um luxo ou um hobby. Para competir com as várias modalidades de transporte público, aplicativos (sucessores dos táxis), serviços de compartilhamento e frotas automatizadas, só mesmo oferecendo as facilidades da mobilidade customizada.
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