Você pode até achar o Golf um carro com design excessivamente frio, sem grande apelo emocional. Mas, se realmente gosta de carros, há de concordar que se trata do melhor Volkswagen fabricado no Brasil. Apesar do downgrade técnico que recebeu quando passou a ser fabricado no Paraná – com a troca do câmbio DSG de dupla embreagem pelo automático AQ250 e da substituição da suspensão traseira independente pelo eixo de torção –, o Golf continua sendo um carro admirável do ponto de vista técnico.
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Agora, na linha 2018, que chega com muito atraso, já na metade do ano, o Golf recebeu alguns retoques visuais, uma simplificação nos pacotes de equipamentos e algumas doses de potência nos motores 1.0 (versão Comfortline) e 2.0 (do esportivo GTI). O 1.0 foi rebatizado de 200 TSI e ganhou 3 cavalinhos; o 2.0 foi rebatizado de 350 TSI e ganhou 10 cv de potência. Só o 1.4 (versão Highline) ficou como estava, mas agora se chama 250 TSI.
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Os novos nomes se referem ao torque em Nm (Newton-metros) de cada versão. Com o downsizing dos motores, a Volkswagen não quer associar a ótima eficiência do 250 TSI à fama de fraco dos motores 1.0. Outros fabricantes adotam a mesma estratégia. Com as modificações, o Golf mais barato agora custa quase R$ 92 mil. É muita coisa, considerando que o Golf mais barato há um ano custava cerca de R$ 77 mil.
Mais equipamentos e futuro de nicho
Claro que o aumento de preço do Golf de entrada veio acompanhado de mais equipamentos. O câmbio automático é só um deles. Mas, se por um lado a Volks surpreendeu ao investir num carro com poucas vendas, por outro praticamente decreta seu desaparecimento em breve, devido ao preço elevado. Como tudo na vida, há explicações. Na visão da Volkswagen, os clientes dessa categoria não querem mais carros com câmbio manual e uma eventual versão mais barata do Golf o colocaria em choque com outro hatchback da marca, o Polo.
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Porém, a própria Volks se contradiz quando explica sua estratégia de hatches. Ela afirma que o Polo significa “conquista” por parte do consumidor e que o Golf é um carro para quem busca “performance”. Tudo lindo. Porém, o que impede um consumidor que busca “performance” de ter um carro mais barato? Por que o consumidor precisa ser obrigado a comprar um carro de quase R$ 92 mil se está mais interessado na parte mecânica do que em certas tecnologias da moda? Por que ter três versões do mesmo carro com a mesma estratégia comercial?
O Golf 1.0 (ou 200 TSI, como quer a Volks) teria que ser um carro mais barato, oferecendo não sete airbags e câmbio automático (como muitos querem), mas sim a sua qualidade dinâmica, apenas com os equipamentos necessários hoje em dia. Essa versão nova poderia até existir, mas a morte do Golf manual com motor 1.0 TSI (turbo com injeção direta de combustível) é uma péssima notícia para quem está interessado apenas no comportamento dinâmico do Golf.
E são muitas pessoas. Segundo uma pesquisa do Mercado Livre (site especializado em classificados online), entre os 25 carros mais populares entre seus usuários, o Golf está em quarto lugar no ranking deste ano. Perde apenas para o VW Gol, o Honda Civic e o Fiat Palio. Entre seus concorrentes diretos, o Golf é 2,6 vezes mais procurado nos anúncios do Mercado Livre do que o Chevrolet Cruze. Em relação ao Ford Focus, o Golf é quatro vezes mais procurado no site.
Nas vendas reais, o Golf tem 24% de participação no segmento de hatches médios, contra 22% do Focus e 42% do Cruze. As vendas de todos eles, entretanto, são baixas – juntos, venderam pouco mais de 5.500 carros este ano. Este, aliás, é o principal fator para a Volkswagen encarar o Golf, a partir de agora, como “um carro de nicho”. Pena que seja assim. Em parte, é culpa dos consumidores, pois a maioria hoje em dia prefere comprar um SUV do que um hatch, apesar de, na prática, não precisar de um utilitário esportivo. Muitos compram SUVs só para ficar na modinha dos carros do momento. Mas não dá para redimir a Volks de sua parcela de culpa.
Apesar de o Golf ser o carro mais vendido na Europa, aqui no Brasil não pega porque ele sempre foi muito caro. Por incrível que pareça, uma das razões de o Golf de entrada ser tão caro é o seu rival Focus, pois, na visão da Volkswagen, “nunca pode existir um Golf mais barato do que um Focus” em nenhum mercado. Uma grande bobagem, pois, pelo menos no Brasil, a imagem do Golf é muito melhor do que a do Focus (também um carro bem conceituado), como ficou claro no ranking do Mercado Livre. Portanto, tem um mercado muito maior para ser explorado. Outra prova disso é que, segundo a Fenabrave, só em maio o Golf teve mais de 7.418 negócios realizados no mercado de usados, uma diferença superior a 2 mil carros em relação ao Focus.
Todos esses fatores transformaram o VW Golf num carro de nicho. É uma pena. Para o futuro próximo, é muito mais fácil vê-lo rodando nas ruas nas versões e-Golf (elétrica) e Golf GTE (híbrida), ainda mais caras e exclusivas, do que nas mãos daquele cidadão que tem um dinheiro para dar num bom carro, gostaria de ter um automóvel mais por suas qualidades técnicas do que por quilos e quilos de equipamentos da moda, mas que será sempre condenado a ter no máximo um Polo (pelo menos dentro da linha Volkswagen). Afinal, o preço de R$ 92 mil ainda é proibitivo para a grande maioria dos brasileiros, em que pese o Golf Comfortline 200 TSI Automático seja um ótimo carro.