
Já ouviu falar do Fiat Mio? Se você consome os bastidores do setor automotivo pode já ter ouvido falar, mas caso esteja por dentro apenas dos lançamentos, talvez não o conheça.
O carro, na verdade, é um conceito apresentado durante o Salão do Automóvel de São Paulo em 2010, e era algo que ninguém esperava. Ao invés de revelar mais um conceito de design, a Fiat trouxe para o Mio uma construção pensada junto com o público. Literalmente.
Durante meses, mais de 17 mil pessoas, de 160 países, enviaram sugestões e ideias em uma plataforma criada pela marca. Ali se discutia de tudo: desenho, tecnologia, conforto, impacto ambiental, o papel do carro nas cidades do futuro.

O projeto foi desenvolvido no Fiat Stile Center, em Betim (MG), e reuniu engenheiros, designers e especialistas em inovação.
Mas a base veio da rua, da comunidade online (o que era de difícil acesso até então por conta da internet limitada) que acompanhava cada etapa. Era uma experiência inédita para a indústria automobilística no Brasil e rara até no mundo.
A proposta era simples e ousada
A Fiat queria entender como as pessoas imaginavam o automóvel do futuro. Para isso, abriu o processo criativo. Qualquer usuário podia comentar, sugerir mudanças e acompanhar as discussões em tempo real.

A plataforma usava licença Creative Commons, o que significava que todo o conteúdo poderia ser compartilhado livremente. Era um conceito de "transparência" que contrariava a lógica mais fechada das montadoras da época.
No final, quase 12 mil ideias foram analisadas. Dali surgiu um carro leve e limpo, com carroceria de fibra de carbono, quatro motores elétricos independentes e interior voltado à sustentabilidade e ao conforto.
“(Foi) um marco na história da Fiat e da indústria automotiva”, lembrou Peter Fassbender, atual vice-presidente de Design da Stellantis na América do Sul.
"O projeto antecipou discussões sobre design, conectividade, sustentabilidade e novas formas de mobilidade”
Quando o futuro chegou mais cedo
Algumas ideias do projeto pareciam ficção científica em 2010. A integração entre carro e smartphone, por exemplo, era um desejo dos participantes, algo que só se tornou realidade anos depois, com Android Auto e Apple CarPlay.

Eles também pediam telas sensíveis ao toque, comandos digitais e até monitoramento remoto. Hoje, praticamente toda a linha Fiat oferece versões desses recursos.
O desenho do Mio, com faróis em LED e linhas geométricas, também influenciou o estilo da marca.
Elementos de sua identidade visual apareceram depois em carros como a Fiat Toro, lançada em 2016, que trouxe a mesma assinatura luminosa marcada pela frente em duas partes.

O Fiat Mio nunca foi fabricado em série. Ainda assim, deixou um rastro importante. Serviu como campo de testes para materiais recicláveis, soluções elétricas e novas arquiteturas modulares.
Mais do que um automóvel, foi uma mudança cultural: a ideia de que ouvir o consumidor pode ser parte da inovação, e não apenas uma etapa de marketing.

Hoje, o modelo está preservado no acervo histórico da marca e é lembrado como um dos primeiros experimentos de coautoria no setor automotivo mundial.
Quinze anos depois, segue atual, não pelas rodas ou pela potência, mas pela visão de que o futuro nasce do diálogo com o próprio consumidor.