O convite da Yamaha era meio vago. Chegar às 9h00 da última sexta-feira na sede da empresa, em Guarulhos, SP, preparado para ficar uma semana fora, deixou os seis pilotos convidados bastante curiosos, inclusive eu. Nem seria preciso levar roupas e equipamentos, apenas o básico. Assim é o Tour Interativo Crosser, que no ano passado, em sua primeira edição, desbravou o Pantanal. Desta vez iríamos percorrer o caminho do ouro, o mesmo que, no século 17, os tropeiros faziam para levar o ouro extraído no Estado de Minas Gerais até o porto, em Paraty, no Rio de Janeiro. Na volta, esses mesmos tropeiros voltavam às minas levando provisões para os mineiros.
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Das trilhas originais, muitas delas tornaram-se estradas asfaltadas, mas trechos originais ainda existem, preservados pelo Instituto Estrada Real. E esse seria o nosso caminho com a Yamaha Crosser, buscando ao máximo percorrer as mesmas trilhas por onde fugiram o nosso ouro e os nossos diamantes.
Não havia dúvida quanto à motocicleta que nos levaria à aventura. A Yamaha XTZ 150 Crosser já era uma conhecida minha, porém em trilhas urbanas, sempre ziguezagueando por meio ao trânsito. Para isso, ela sempre se portou muito bem. Leve e ágil, a Crosser 2018 estreia uma nova versão, a Crosser Z, com para-lama dianteiro alto, para melhorar o desempenho no fora de estrada. A versão já existente, de para-lama dianteiro baixo, passou a se chamar Crosser S.
Chegando ao escritório da Yamaha, três Crosser S e quatro Crosser Z estavam expostas ao pé da escadaria. Entre os sete pilotos, dois jornalistas, eu e o Téo Marcarenhas, trilheiro mineiro das antigas e profundo conhecedor da terra que passa sob os pneus das motocicletas. Seu colega mineiro Gustavo Jacob, presidente da federação mineira de motociclismo, também pilotou uma das motocicletas. Tínhamos ainda como colegas de trilhas e estradas o youtuber Patrick Gasparetto, que está iniciando a vida sobre duas rodas, e o também jovem aventureiro Matheus Oliveira, que passa a sua vida na estrada também sobre uma Yamaha 150 Crosser. O sexto piloto é uma celebridade, o multi-campeão de motocross Jorge Negretti, meu professor e agora amigo. Lembra na semana passada, quando eu tive aulas com ele sobre como pilotar na terra? E o sétimo piloto é o também jornalista Laner Azevedo, só que desta vez no papel de assessor de imprensa da Yamaha.
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Foi esse coeso grupo que passou uma semana desbravando caminhos tão deslumbrantes que só mesmo indo até lá – de motocicleta, obviamente –, para conhecer a beleza do nosso país. As fotografias do talentoso Gustavo Epifanio, também conhecido por BA, apenas dão uma ideia geral da coisa.
Logo no início, notei em cada um a mesma sensação que tive de “vamos rodar 1.400 km sobre uma 150?”. Não, não seria melhor uma motocicleta maior, já que a intenção era mesmo enfrentar as trilhas com uma motocicleta popular, de entrada, de baixo custo de aquisição e manutenção, para que mais pilotos e motociclistas possam repetir nosso percurso e conhecer de perto os locais por onde passamos.
Em relação ao desempenho das Yamaha XTZ 150 Crosser, posso acabar de vez com o suspense: todas elas passaram com nota dez por todos os desafios. Apesar de contar com apenas pouco mais de 12 cavalos de potência, o valente motorzinho gira alto e enfrenta com tranquilidade o asfalto e a terra. Nas trilhas, mesmo com pneus mais adequados para o asfalto, a sua agilidade e o bom trabalho das suspensões em momento algum nos deixaram em maus lençóis. Posso dizer que, mesmo para quem não é expert no fora de estrada, a Crosser é facílima de ser pilotada.
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A jornada
No primeiro dia, o percurso foi de Paraty, RJ, até São Lourenço, MG. Nos primeiros quilômetros o piso é de asfalto, passando a blocos de concreto ao atravessar a Serra da Bocaina, com a vida animal preservada. Passando a cidade paulista de Cunha, a estrada asfaltada é comum e fazemos um desvio de cerca de 20 km pela Rodovia Presidente Dutra, entre Guaratinguetá e Cruzeiro. O motivo é que o caminho original da Estrada Real nessa região teve ocupação urbana. A primeira cidade mineira é Passa Quatro, onde começa o trecho de terra até o destino do primeiro dia, São Lourenço.
O segundo dia nos leva a Tiradentes, MG, com passagem pelos municípios de Cruzília e Carrancas, longo trecho de terra percorrido à noite. Um último trecho asfaltado passa por São João Del Rey até o destino final do dia.
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Saindo de Tiradentes, no terceiro dia da aventura, o caminho passa por Prado e Lagoa Dourada, terra do rocambole. Chegando ao município de Ouro Branco, uma grande montanha nos convida a entrar por uma trilha ao lado da estrada. É o Morro do Ouro Branco, com uma altitude que permite uma visão privilegiada dos vales e montanhas ao redor. Para chegar às partes altas, as sete Yamaha Crosser proporcionaram muita adrenalina aos pilotos. Ouro Preto está bem próximo e marca o fim desse terceiro dia de viagem.
O trecho da estrada Real entre Paraty a Ouro Preto é conhecido por Caminho Velho. Há um Caminho Novo, partindo do Rio de Janeiro com o mesmo destino final. O novo percurso foi criado pelos comerciantes que não queriam mais aportar em Paraty, devido aos ataques de piratas naquela região. Essas duas variantes são conhecidas como Caminho do Ouro, devido à extração desse metal precioso nessa região.
A partir de Ouro Preto, a Estrada Real é conhecida por Caminho dos Diamantes, por chegar até a cidade de Diamantina, onde havia a exploração de diamantes. Esse seria nosso destino ao fim dos dois últimos dias.
Talvez a experiência mais incomum dessa aventura tenha sido a descida a uma mina de ouro na cidade de Mariana, bem próxima a Ouro Preto. Durante a descida em um carrinho sobre trilhos adaptado para pessoas, me senti no filme dos Goonies. E a 120 metros de profundidade, em uma visita de 40 minutos, também ficamos sabendo como os mineiros se sentiam trabalhando seis horas por dia durante praticamente a sua vida inteira.
O quarto dia terminou em Conceição do Mato Dentro, depois de 100 km de estradas de terra, também no escuro. Nesse ponto eu já estava bastante familiarizado com as reações da motocicleta nas erosões e lamaçais e com o seu bom farol. E o quinto e último dia nos levou ao destino final, Diamantina, não sem antes passarmos por regiões belíssimas e por cidades muito interessantes. Milho Verde é uma delas, com sua vidinha pacata tentando não se tornar um point turístico como aconteceu com tantas outras.
Pouco antes de escurecer, nos deparamos com um rio, sobre o qual transpusemos por uma velha ponte metálica. Mas alguns dos pilotos decidiram que passar por dentro do rio seria mais interessante. E lá foram. A noite em Diamantina foi de confraternização, mas a notícia de que rodaríamos mais um dia, já fora da Estrada Real, foi animadora.
No caminho de Diamantina ao aeroporto, na região de Belo Horizonte, levamos as sete Yamaha
150 Crosser ao novo autódromo Circuito dos Cristais, na cidade de Curvelo, para uma última experiência com as motocicletas. Mais diversão, desta vez (quase) raspando o joelho no chão. Pena, acabou. Uma longa cochilada no ônibus até o aeroporto e mais uma chacoalhada em uma rápida viagem de avião nos trouxe para casa, esperando ansiosos pela próxima aventura.