O carro mais barato do Brasil é um fracasso. Mas talvez seja o que tenha o futuro mais promissor pela frente. Nas mãos da Chery Brasil, o pequenino QQ vendeu apenas 2.879 unidades de janeiro a novembro. É um número miserável num país de 200 milhões de habitantes. Seria ruim para qualquer carro normal. Mas é ainda pior se justamente por ser o carro mais barato do Brasil: tem três versões e parte de R$ 26.690. Não que o QQ seja um grande sucesso em algum lugar. Até mesmo na China, sua terra natal, ele vende mal: apenas 17 mil unidades/ano. O que pode mudar a vida do QQ são quatro letras: CAOA. Elas formam a sigla de Carlos Alberto OIiveira Andrade, um dos empresários mais ousados do Brasil, dono do Grupo Caoa.
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Por meio de um acordo de US$ 60 milhões, o Grupo Caoa, brasileiríssimo, comprou 50% da operação da Chery Brasil, incluindo a fábrica de Jacareí (SP). O fabricante agora passa a se chamar Caoa Chery e já divulgou que pretende investir US$ 2 bilhões nos próximos cinco anos. A verdade é que Caoa salvou a Chery, pois seus outros carros vendidos no Brasil têm números ainda mais irrisórios do que o QQ. O Tiggo, um SUV compacto, vendeu 23 unidades. Quase dá para contar os dedos dos pés e das mãos. O Celer emplacou 267 exemplares do modelo hatch e 195 do sedã. Pífias 3.341 unidades para uma marca que tem ótimos profissionais, mas faltava-lhe, além de dinheiro, ousadia, estratégia e rede.
Não sabemos ainda quais são os planos de Caoa para a nova Chery. Nem sequer se os carros continuarão se chamando Chery, se serão Caoa Chery ou se um novo nome surgirá. Afinal, na própria China e em outros mercados a Chery está rebatizando alguns carros. Mas uma coisa podemos afirmar com certeza: não existe um único modelo da Chery chinesa capaz de justificar tamanho otimismo por parte do empreendedor Carlos Alberto de Oliveira Andrade. Além do QQ, a Chery chinesa só tem mais cinco carros dignos de registro: o hatchback Fulwin 2 (42 mil vendas/ano), o Tiggo 3 (118 mil carros/ano, na segunda geração, lançada em 2014), o Tiggo 5 (maior, 55 mil carros/ano), o Tiggo 7 (lançado há um ano, 5 mil vendas/mês) e o elétrico eQ1, lançado em abril deste ano.
Nem o Grupo Caoa, acostumado a tirar leite de pedra de marcas como a Renault (anos 1990) e a Hyundai (anos 2000), seria capaz de transformar esses carros em sucesso nacional. A nova montadora brasileira poderia beber também na fonte da Karry, uma marca da Chery especializada em... minivans! Quem compra minivans hoje em dia no Brasil? Ninguém. Portanto, somando os 72 mil carros/ano mais os 505 mil carros/ano da Chery chinesa, temos um negócio de quase 600 mil carros no mercado matriz. Mas, calma: este ano a Chery caiu na China e dificilmente passará de 423 mil emplacamentos, o que representa esquálidos 2% do maior mercado do mundo.
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A visão do nordestino
É aqui que entra o tino comercial do Sr. Caoa. Para quem não sabe, esse paraibano arretado entrou no mercado de carros quando foi mal atendido numa revenda Ford. Decidiu comprar a concessionária inteira de Campina Grande e trocar a carreira de médico pela de empresário da indústria automobilística. Inicialmente vendendo carros da Ford, construiu uma rede de concessionárias respeitável, introduziu a Renault no país, levantou a Hyundai quando nem mesmo os coreanos acreditavam que a marca (mal tratada pelo Grupo Garavelo nos anos 1990) pudesse ser recuperada e hoje é responsável por uma quota parte importante nos negócios da empresa, uma das maiores do Brasil.
Com a Hyundai, o Grupo Caoa pode chamar Audi, BMW e Mercedes-Benz para a briga. Uma ousadia que foi alicerçada por milionárias campanhas de marketing nos principais telejornais da televisão brasileira, na primeira página dos maiores jornalões e em infinitas páginas duplas nas revistas semanais. Mas a Hyundai, se não é uma marca premium alemã, pelo menos não faz feio perante nenhum concorrente. Com a Chery, a estratégia do Caoa terá de ser diferente. Os chineses simplesmente não têm produto para brigar no topo. Mas fazem um carro que tem tudo a ver com o Brasil: o pequenino QQ. Com seu poder de marketing e de distribuição, a Caoa Chery pode espalhar o QQ pelos quatro cantos do Brasil.
Motor 1.0 flex, visual agradável e bons equipamentos podem fazer do QQ um carro bem vendido no mercado brasileiro. Existem dois mercados incríveis para o QQ: a cidade de São Paulo, entupida por SUVs gigantes com apenas uma pessoa dentro deles, engarrafando o trânsito, e o Nordeste brasileiro. Digo Nordeste porque, infelizmente, é a região do Brasil mais prejudicada pelos desgovernos de décadas. Mas vale também para várias outras regiões em que existam brasileiros com necessidade de locomoção e pouca renda. O Brasil é muito grande, os transportes públicos são péssimos e as pessoas precisam de um carro barato e econômico para se locomover. Nas mãos do Sr. Caoa – que a revista Istoé Dinheiro sabiamente chamou de “construtor de marcas” –, o QQ pode ter uma trajetória revigorada.
Ah, mas se ele continuar vendendo mal na China, talvez a produção pare. E isso lá é problema para o Grupo Caoa? Muito pelo contrário, ele é especialista em lidar com esse tipo de situação. Afinal, em que lugar do mundo um carro é vendido com três gerações diferentes? No Brasil. Por quem? Pela Hyundai Caoa. Qual carro? O Tucson de primeira geração, o ix35 (Tucson de segunda geração) e o New Tucson (terceira geração). Simples assim: com bons ajustes técnicos, uma ampla rede de distribuição e um marketing forte e duradouro, o Chery QQ pode invadir nossas ruas.
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Carros do futuro
Uma vez implantada a base dessa nova empresa Caoa Chery, a estrada para o futuro estará aberta. Recentemente, a Chery mostrou algumas novidades que vêm aí, para substituir os horríveis carros que têm na China. Uma nova marca, chamada Exeed, foi apresentada na Europa, com um visual bem mais moderno. Da mesma forma, o sedã Arrizo também pode se transformar em marca. Os novos projetos trazem carros como o Arrizo 5, o SUV M7 e aquele que pode ser a segunda cartada da Caoa Chery no Brasil: o Tiggo 5, um novo SUV médio com motor 1.5 turbo e outros trunfos que Sr. Caoa explorou tão bem com o trio Tucson/ix35/New Tucson, sem falar do Santa Fé e de outros menos famosos.