A questão da briga entre irmãos é tão antiga quanto Adão e Eva. Segundo a história bíblica, os irmãos Caim e Abel fizeram oferendas a Deus, que preferiu a ovelha de estimação de Abel aos frutos do trabalho braçal de Caim. Enciumado, Caim armou uma emboscada e matou Abel. Desde o Gênesis, portanto, irmãos nem sempre têm uma história de união. E não é diferente na indústria automobilística, com Polo e Kwid, por exemplo. Teoricamente, um carro novo na linha vai servir de trampolim ou de destino para que o cliente não troque de marca. Mas, na prática, nem sempre isso acontece.
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Temos dois casos cristalinos no mercado brasileiro neste início de 2018. Um diz respeito aos irmãos Polo e Up, da família Volkswagen; outro refere-se aos irmãos Kwid e Captur, da família Renault. Já previmos aqui (e de fato aconteceu) que a chegada do Polo mataria o Fox, que foi reduzido a apenas duas versões.
No Game of Thrones da Volkswagen, o CrossFox foi o primeiro a ter a cabeça decepada. Mas não só ele. Com a chegada do Polo e o reposicionamento do Gol, quem acabou pagando o pato junto com o Fox foi o Up. Um carro sempre injustiçado pelos brasileiros, pois merecia vender mais do que vende. Porém, também muito mal trabalhado pela Volks, pois ele sempre foi muito caro para o consumidor.
O fato é que o Polo continua vendendo bem, acima de 6 mil unidades por mês, mas o Up despencou para 1,5 mil. Apesar de ser, disparado, o melhor subcompacto do Brasil, o VW Up leva um banho de vendas de seus mais diretos rivais, o Fiat Mobi e o Renault Kwid. Kwid em alta, Captur em baixa
Na Renault temos a mesma situação. Por um lado, a boa notícia é que o Kwid parece ter engrenado nas vendas e conseguiu mais um mês vitorioso em março. Com 6,4 mil unidades emplacadas, o Kwid posicionou-se à frente do Polo e do Gol. Um grande mérito da Renault, pois muitos duvidaram das vendas realizadas em fevereiro. Por outro lado, o sucesso do Kwid vem acompanhado do maior fracasso da temporada, que é o Renault Captur.
Considerado o SUV mais bonito do Brasil, segundo uma eleição de jornalistas do Prêmio Americar, o Captur tem a seu favor a robustez de seu irmão Duster. Porém, suas vendas no primeiro trimestre foram lamentáveis e ele mal passou das 3,9 mil unidades.
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Para ser ter uma ideia, o Captur é apenas o 40º carro mais vendido do país atualmente, se considerarmos as picapes. Mesmo com um visual muito menos vistoso e dirigibilidade inferior, o Duster está grudado no Captur no ranking dos SUVs e na classificação geral está apenas seis posições atrás. Enquanto isso, carros como o Nissan Kicks e o Hyundai Creta brilham e competem em pé de igualdade com os líderes Jeep Compass e Honda HR-V.
Mas, por que isso acontece? Essa canibalização só pode ter uma explicação. Quando as marcas decidem apostar num novo veículo, todos os esforços de marketing, comunicação e produção são destinados a ele. Assim, ao invés de tirar vendas de seus concorrentes, esses carros canibalizam seus próprios irmãos.
Certa vez, um executivo da Volkswagen comentou comigo sobre a gangorra em que viviam o Gol e o Up: “Se fazemos anúncios do Gol, o Up cai; se colocamos nossa força de marketing no Up, é o Gol que cai”. E assim temos hoje, no Brasil, apesar de não estarem posicionados para o mesmo público, a curiosa canibalização do Up pelo Polo e do Captur pelo Up. Irmão matando irmão, assim como Caim e Abel.
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