Uma das poucas fabricantes brasileiras, a Troller tem um público bem restrito. Seu único produto, o jipinho T4, não é bem indicado para andar nas ruas (embora a marca tente argumentar que pode ter uso urbano). É quando colocamos o utilitário na terra, lama ou areia que ele mostra todos os seus atributos e pode até convencer as pessoas a comprar um só para brincar em trilhas no fim de semana. A Ford, dona da Troller desde 2007, tentou fazer o mesmo conosco em um rali de regularidade, especial para jornalistas.
LEIA MAIS: Modelos 4x4 - o que esperar deles na era de carros autônomos e compartilhados
Se dependesse apenas do esforço, poderia ter ficado muito tentado a comprar um Troller T4. Para quem não conhece, estou falando da terceira geração do jipe compacto fabricado em Horizonte (CE), totalmente desenvolvido no Brasil. Essa versão foi lançada em 2014 e atualmente é vendidade por R$ 127.088, ou R$ 129.990 na versão especial Bold – que terá um segundo lote, de mais 180 unidades.
É um carro de nicho. Andar com ele na cidade não é nada bom, já que ele foi feito para andar em terrenos acidentados. Seu diâmetro de giro é muito pequeno, transmite todas as regularidades para dentro da cabine, sua embreagem é muito pesada e, por ser grande e pesado (pesa 2.140 kg), atrapalha em manobras.
Por isso, quem estiver olhando para um Troller, deve colocar na cabeça que é um carro para o fim de semana na terra. Pode quebrar o galho na "Selva de Pedra", mas não é seu "habitat natural". Deixe-o na garagem, coloque rodas para terra e vá fazer trilha. E há várias maneiras de fazer isso, desde encontros de jipeiros até eventos organizados pela própria Troller, que vão do rali de regularidade a passeios e viagens mais longas.
Rali mais calmo
A Troller foi boazinha com os jornalistas e preparou um evento mais fácil do que o normal para uma etapa da Copa Troller, seu campeonato de rali de regularidade. Fomos até Itupeva (SP), onde o hotel Quality Resort mantêm uma pista off-road (muito utilizada em campeonatos). Por sorte, a chuva do fim de semana não afetou tanto as estradas quanto poderia e o tempo firme de segunda-feira ajudou a secar a terra – para azar do segundo grupo, que fez a corrida na quarta-feira, choveu a ponto de cancelar a prova.
LEIA MAIS: SUVs são apenas carros da moda ou uma tendência sem volta no mercado?
Logo definiram que teríamos três pessoas por carro, em três etapas seguindo variações de toda a pista e a soma dos resultados definiria o time vencedor. Iriamos alternar quem iria dirigir, quem ficaria de navegador e quem iria no banco traseiro como “Zequinha”, o passageiro que fica de ajudante para o navegador. Cada percurso tinha quase 6 km, o que pode parecer pouco, mas é feito inteiramente na terra.
Como é um rali de regularidade, o objetivo é passar pelos pontos da pista dentro do horário determinado pela organização, mantendo uma média de velocidade. Não é para pisar fundo e bancar o Sébastien Loeb ou Colin McRae – e nem poderia, já que passar de 45 km/h rende uma penalidade. E, pela pista, a possibilidade de acelerar demais é baixa, já que a trilha é apertada e com poucos trechos que permitem esticar as marchas.
O navegador tem a missão de acompanhar as instruções entregues pela organização, que indica por onde seguir, a que velocidade, qual o tempo ideal e algum aviso sobre o obstáculo, como alguma erosão perigosa. Como somos café-com-leite, a organização ainda incluiu avisos de quando deveríamos parar e acionar o modo reduzido da tração 4x4.
Parece fácil, não? Acredite, não é. Isso porque algumas instruções acontecem perto uma da outra, o que pode confundir o navegador iniciante. Alguns trechos podem enganar, como uma ordem de fazer o retorno por cima do mato, ao invés de seguir a trilha. E, como devemos passar dentro do tempo especificado, o motorista deve ter muita precisão no acelerador, para manter uma velocidade constante. Segundo a organização, os competidores da categoria Master conseguem manter uma média de variação de décimos de segundo em relação ao tempo ideal.
Não conhecíamos a pista, então havia aquele nervosismo, tentando antecipar que tipo de obstáculos encontraríamos pelo caminho. Logo na primeira curva, já estávamos em uma estrada de terra bem irregular. Não andamos nem um quilômetro e já apareceu uma descida cheia de erosões, que reduziu a velocidade para menos de 10 km/h. Uma das laterais tinha uma depressão muito funda. Se a roda entrasse ali, iria acabar com nossa corrida antes mesmo de começar.
LEIA MAIS: Veja os carros fabricados no Brasil menos vendidos em 2016. Confira a lista
A tortura em forma de pista continuou em uma subida, até chegar a uma área criada especialmente para mostrar as capacidades extremas do T4. Começa em uma subida bem inclinada que impressiona pelo visual, mas não pelo obstáculo em si. Acionamos a reduzida, primeira marcha engatada e aceleração constante. Poucos segundos depois, já estamos no topo. Na hora de descer, mesmo procedimento. Como tem auxílio de descida em rampas, é só deixar o carro solto que ele segura a velocidade sozinho até que esteja em um piso nivelado.
Repetimos a dose, porém com uma diferença: a descida agora terminava em um vão cheio de água. Assim que o Troller terminou de descer, engatamos a segunda e aceleramos com gosto, para espalhar água e lama. O jipinho patina um pouco, como esperado de um carro nesta situação, mas segue em frente com valentia. Os demais trechos seguem a variação de terrenos acidentados pelos quais já passamos – uma repetição, mas sempre divertida.
Modo de vida
Só esse gostinho do rally de regularidade mostrou porque a tribo dos jipeiros vem crescendo tanto. O Troller T4 vira um brinquedo que pode ser aproveitado por toda a família. É normal encontrar homens e mulheres com seus filhos participando das provas, além de aproveitar uma boa viagem (e bem fora do comum). Alguns levam tão a sério que participam de todas as etapas, mesmo em outros estados, mandando o carro por plataforma e pegando um avião para o destino alguns dias depois.
Há um clima de companheirismo ao participar de uma prova dessas. Novatos são bem-vindos e logo começam a fazer amigos, indicando grupos na internet para aproveitar passeios e trilhas organizados por aí. A própria Troller faz eventos diferentes, para quem não é muito ligado em competição, como o Passeio Troller, dez viagens de um dia em diversas cidades, sempre com foco no uso das habilidades off-road do T4. Quem preferir uma viagem mais longa pode participar do Expedição Troller, quatro dias durante feriado da Independência dedicados a desbravar a região da Serra da Canastra. Não faltam opções para sujar o jipinho de terra e lama.
É uma diversão cara? Com certeza. Afinal, tem que comprar um Troller T4 e arcar com todos os gastos contínuos de qualquer outro carro: manutenção, combustível, impostos e mais. E, invariavelmente, irá gastar também quando for para a trilha. A Copa Troller tem um custo de participação usado para custear a organização e o prêmio. Mesmo uma trilha organizada por grupos independentes tem os seus gastos. Como todo hobby, tem o seu preço. Vale a pena? A crescente quantidade de participantes dos eventos da marca e a expectativa de elevar as vendas anuais do jipinho em 15% mostra que sim.
Ficha técnica
Preço: a partir de R$ 127.0888
Motor: 3.2, cinco cilindros, a diesel
Potência: 200 cv a 3.500 rpm
Torque: 47,9 kgfm a 1.750 rpm
Transmissão: Manual, seis marchas, tração integral
Suspensão: Eixo rígido na dianteira e na traseira
Freios: Discos ventilados na dianteira e sólidos na traseira
Pneus: 2555/65 R17
Dimensões: 4,10 m (comprimento) / 1,87 m (largura) / 1,97 m (altura), 2,59 m (entre-eixos)
Tanque : 62 litros
Porta-malas: 134 litros
Consumo: 9,8 km/l (cidade) /12,3 km/l (estrada) com diesel
0 a 100 km/h: 12,3 segundos
Vel. Max: 168 km/h