"Nosso show está passando por sua transição mais significativa nas últimas três décadas". A declaração é de Rod Alberts, diretor de um dos salões do automóvel mais tradicionais do mundo: o Salão de Detroit. O discurso busca vender um novo evento, ou melhor, um novo show ao público e, principalmente, às montadoras.

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O passo mais ousado nesse sentido foi mudar a data de abertura. Os organizadores do Salão de Detroit anunciaram que, a partir de 2020, ele será realizado anualmente em junho, em vez de janeiro.

O comunicado diz que o novo cronograma permitirá que montadoras, fornecedores da indústria e outros participantes "possam promover experiências fora das quatro paredes da exposição", que é realizada no centro de convenções do Cobo Center, na região conhecida como Motor City.

O Salão de Detroit passará por mudanças significativas e o Cobo Arena promete ser um espaço de eventos mais inovador
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O Salão de Detroit passará por mudanças significativas e o Cobo Arena promete ser um espaço de eventos mais inovador


O interesse do público até pode ter diminuído pela cidade do motor, mas o que se nota é algo ainda mais preocupante. Os fabricantes têm desistido dos salões ao redor do mundo. E sem as principais estrelas, não há visitantes.

A indústria dos “auto shows”  deve mudar globalmente à medida que o setor automobilístico passa por sua maior transformação em mais de um século. As montadoras estão buscando, cada vez mais, maneiras de apresentar seus lançamentos e engajar os consumidores com as novas tendências de comunicação. A internet é um dos principais caminhos com transmissões ao vivo de lançamentos.

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A forma tradicional de apresentar um novo veículo com convites à mídia parece com os dias contados. Aliás, isso é algo que o automobilismo já experimentou anos atrás. Eventos grandiosos para apresentar, por exemplo, uma Ferrari na Fórmula 1 foram substituídos por "lives" em redes sociais.

Detroit decidiu se mexer. "Quando olhamos para sair do tradicional modelo de auto show, temos que perseguir uma nova forma, aproveitando as ruas da cidade e outros espaços culturais", acrescentou o diretor do evento.

Tradicionalmente, a feira é realizada na gelada Detroit em meio ao rigoroso inverno local. Em 2020, será organizada num clima mais favorável na primavera americana. Há também uma razão econômica: ajudará a reduzir custos uma vez que sairá do período do feriado do Ano Novo, já que ocorre na primeira semana do ano.

A transformação americana

A picape Chevrolet Silverado foi mostrada no Salão de Detroit, na edição de 2018
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A picape Chevrolet Silverado foi mostrada no Salão de Detroit, na edição de 2018

A principal fonte de renda de Detroit é a indústria automobilística, setor que passou por grandes recessões. A mais recente foi em 2009, o que ajudou a cidade a decretar falência, em 2013, com dívidas de US$ 20 bilhões, segundo informou na época o jornal The New York Times.

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Nos últimos anos, o brilho do Salão do Automóvel de Detroit foi afetado e muitos disseram que, em algumas edições, parecia mais um funeral do que uma celebração. Essa constatação explica a mudança de estratégia.

A região de Detroit abriga a sede mundial da General Motors, da Ford e da Fiat Chrysler. E apesar do salão ser no quintal de casa, elas parecem mais preocupadas agora em fazer o dever de casa.

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A General Motors, por exemplo, maior fabricante de automóveis da América, prepara uma mudança fundamental em sua visão da indústria e já anunciou planos para 20 novos modelos totalmente elétricos até 2023, incluindo dois nos próximos 18 meses.

A Ford também fez seu anúncio, destacando que acrescentaria 13 modelos elétricos nos próximos anos, com um investimento de US$ 4,5 bilhões em cinco anos. E vai além, ao dizer que vai concentrar sua produção em utilitários esportivos e veículos comerciais. Terá apenas o Focus Active e o Mustang na linha de automóveis.

Os planos estão em andamento e não se concentram mais em salões. A receita do marketing está dividida com foco nas novas plataformas. O exemplo da Tesla, de montadora enxuta e inovadora, tem sido seguido.

Realidades distintas

O superesportivo  Ford GT, com mais de 600 cv, foi uma das atrações do Salão de Detroit em janeiro de 2015
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O superesportivo Ford GT, com mais de 600 cv, foi uma das atrações do Salão de Detroit em janeiro de 2015

Mas a história do Salão de Detroit não se apaga. Ele marcou grandes momentos da indústria automotiva internacional. Na minha carreira, comecei a visitar o Naias, como é chamado este show, na década 1990 até o ano de 2017.

Pude presenciar alguns lançamentos memoráveis para o setor, como as várias versões do Mustang, Camaro, Viper, Cherokee, as grandes picapes norte-americanas, e tantos outros. Falar de todos os veículos que marcaram época resultaria num livro, mas é possível selecionar duas realidades marcantes em anos recentes.

Em 2015, a Ford promoveu o “revival” do Ford GT, um superesportivo de 650 cv. Foi apresentada uma bela versão do lendário carro esportivo glorificado nas competições de Le Mans nos anos 1960. A Ford produziu cerca de 1.000 unidades do Ford GT vendidos com exclusividade pela internet. 

Em 2007, a General Motors deixava de lado os carrões e super picapes para mostrar o conceito de uma nova era para o mercado americano. Ela trouxe ao Salão o conceito do Volt plug-in abrindo o caminho na América do Norte para os carros elétricos.

Famoso por negar a mudança climática, o então vice-presidente da GM, Bob Lutz, disse na coletiva de imprensa: “Aqui está o Chevrolet Volt, um carro movido à eletricidade. Estou chocado, Realmente chocado. Um veículo elétrico da GM é uma verdade inconveniente”.

A versão conceitual do Volt elétrico chamou a atenção do público no Salão de Detroit de 2007
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A versão conceitual do Volt elétrico chamou a atenção do público no Salão de Detroit de 2007

Na realidade, o mercado já esperava essa inovação. Choque mesmo seria algum dia o fim do Salão de Detroit . A cidade, casa de grandes montadoras, perderia o brilho. O velho e o novo ainda podem andar juntos, e esforço parece não faltar.

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