Rebatizado de “Cômpas”, o Jeep Compass (lê-se “Compéss”) se tornou um dos SUVs mais desejados do Brasil
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Rebatizado de “Cômpas”, o Jeep Compass (lê-se “Compéss”) se tornou um dos SUVs mais desejados do Brasil

O Jeep Compass, novo queridinho da família brasileira, é hoje a maior ameaça ao reinado do Honda HR-V, o queridinho-mor do Brasil. Primeiro, um pitaco sobre a pronúncia. A forma correta de dizer o nome do carro é “compéss”, mas por algum motivo a FCA mudou para “cômpas”. Tipo assim, abrasileirou. Mas vamos ao que interessa. O Compass é um SUV de fato. Tem capacidade off-road indiscutível, o que para mim seria determinante. Já o HR-V, líder do segmento de SUVs (Sport Utilities Vehicles), não passa de um crossover, que vem a ser a mistura de qualquer outro tipo de carro (no caso, o hatch) com um legítimo SUV. O Renault Kwid também entraria nessa conta.

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 Mas, calma.

 Na última coluna, vários leitores ficaram indignados porque eu me referi ao Kwid como um “SUV compacto” o tempo todo, exatamente ao gosto da fabricante. Mas o fiz porque eu mesmo, recentemente, num artigo para  a revista Motor Show, acabei descobrindo que o público não está nem aí para esse purismo dos especialistas. Então, refiz meus conceitos e passei a chamar todos os crossovers de SUVs (como o Jeep Compass ) sem constrangimento. Pra que lutar uma luta perdida? Seria como dar uma de Dom Quixote, que a certa altura “saiu em louca disparada”. Pra que? “Pra nada.”

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Desde seu lançamento, o Honda HR-V passou longe de ser um carro para andar na lama, mas é o SUV mais vendido

 Se pegarmos o ranking de vendas da Fenabrave, falando só dos 10 SUVs mais vendidos do ano (Honda HR-V, Jeep Compass, Jeep Renegade, Hyundai Creta, Ford EcoSport, Nissan Kicks, Renault Duster, Toyota SW4, Honda WR-V e Peugeot 2008), eu diria que só o SW4 poderia ser considerado um legítimo utilitário esportivo. Mas, considerando os novos tempos, não seria um absurdo incluir também os dois Jeep e o Duster nessa categoria. Mas tudo isso é perda de tempo, pois até a Nissan, que criou o conceito de crossover com o Qashqai, ficou com medo de usá-lo no Brasil e tascou um “SUV urbano” para descrever o Kicks. Simplesmente porque os brasileiros querem assim.

A cultura do SUV

 Então tá. Quem somos nós para discutir isso? Somos uma espécie de elite cultural? Sobre essa “classe” de pessoas, um professor da Universidade de Vanderbilt, Richard Petersen, disse: “Constatamos uma reorientação da atitude política da elite como grupo de status, daqueles intelectuais esnobes que desprezam toda cultura popular, vulgar ou de massas”. Claro que Petersen não estava falando sobre carros, mas cabe como uma luva nessa polêmica da rejeição do termo SUV pelos puristas automotivos.

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 Disse mais o professor: “Não há nada cultural que eu rejeite previamente sem fruí-lo, embora também não haja nada cultural com que eu me identifique de modo inabalável e definitivo a ponto de excluir outros prazeres”. E completou: “Não se trata mais de um gosto (requintado) que se opõe a um gosto (vulgar), mas de [...] uma disponibilidade a consumir tudo e desfrutar de tudo sem nada discriminar, sem uma seletividade a priori da apreciação, da aversão ou da incompreensão”.

O Kwid nem foi lançado e já causa inveja em muito carro famoso. Tudo pela estratégia da Renault de fazer dele um SUV
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O Kwid nem foi lançado e já causa inveja em muito carro famoso. Tudo pela estratégia da Renault de fazer dele um SUV

 Quando o Up (ou up!, como quer a Volkswagen) foi lançado no Brasil, ousei começar o texto de avaliação do carro com uma citação de Anitta. Sim, ela mesma! Na época, não tão famosa como hoje. Quase fui apedrejado por alguns leitores. Então, a esses guardiões da tradição, que exigem um carro com a coluna A e C quase a 90 graus, tração 4x4 com reduzida, altura do solo capaz de atravessar o Tietê sem sujar as portas, ângulos de entrada e saída suficientes para escalar um muro e um ponto H (posição do motorista) tão elevado que causaria inveja a um caminhoneiro, eu respondo com um trecho das “44 Cartas do Mundo Líquido Moderno” que Zygmunt Bauman escreveu para a revista italiana La Repubblica dele Donne:

“Falar sobre a capacidade de durar por muito tempo não é mais um elogio aos objetos nem aos vínculos humanos. Presume-se que uns e outros sejam úteis apenas por um tempo fixo e depois se desintegrem, sejam rasgados ou jogados fora quando ultrapassam seu tempo de validade – o que ocorrerá mais cedo ou mais tarde. Assim, devemos evitar a posse de bens de longa duração, sobretudo aqueles que nos custam mais descartar. O consumismo de hoje não visa ao acúmulo de coisas, mas à sua fruição instantânea e imediata”.

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Na Europa, a Nissan lançou o Qashqai como um crossover; no Brasil, teve medo e preferiu chamar o Kicks de “SUV urbano”

Como sabemos, a indústria automobilística é rápida ao captar as mudanças da sociedade. As pessoas não queriam mais aqueles jipões enormes, com carroceria sobre chassi, como um caminhão, ruins de guiar na cidade e perigosos na estrada. Mas queriam – e querem cada vez mais – o conceito de SUV em seus carros. Por isso eles se tornaram mais baixos e perderam muito da essência, mas ficaram bons de guiar. E vendem como nunca! Espertas são a Honda (com HR-V e WR-V), a Jeep (com Compass e Renegade) e a Renault (com Duster, Captur e agora Kwid), que estão apostando alto nessa categoria.

 E para encerrar meus argumentos sobre os SUVs, entre os quais o Jeep Compass, que não são SUVs para muitos de nós, mas que são para o público consumidor, deixo mais uma lição de meu ídolo Bauman: “Ai daqueles que guardam tudo na memória: as trilhas confiáveis de ontem poderão dar amanhã em becos sem saída ou em areia movediça, e os padrões habituais de comportamento, antes à prova de erros, podem levar ao desastre, e não ao sucesso”.

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