Nem tudo que parece é. Especialmente quando se trata do mercado brasileiro de carros. Na verdade, está cada vez mais difícil interpretar os números de venda de automóveis. Não basta mais simplesmente olhar o ranking e dizer que este ou aquele carro supera comercialmente seus concorrentes. É preciso entender o tipo de venda e as condições na qual ela é feita. Por isso, afirmo com toda convicção: o Toyota Corolla , o Honda HR-V e o Fiat Mobi hoje fazem mais sucesso comercial do que os Jeep Compass e Renegade e o VW Gol, apesar de venderem menos.
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Quais foram os carros mais vendidos do Brasil em 2019? A lista oficial indica: Chevrolet Onix, Ford Ka, Hyundai HB20, Renault Kwid, VW Gol , Fiat Argo, Chevrolet Prisma, VW Polo, Jeep Renegade e Jeep Compass. Está certo esse ranking? Não. Na verdade, o ranking oficial de vendas reflete muito mais as estratégias industriais das montadoras do que o carro efetivamente comprado pelo consumidor. A lista real, praticada pelos brasileiros, é outra. Nela, saem quatro carros (Gol, Prisma, Renegade e Compass) e entram outros quatro (Mobi, Onix Plus, HR-V e Corolla).
Estamos falando da distorção cada vez maior que as chamadas vendas diretas estão provocando no mercado brasileiro. Nunca se vendeu tanto carro em lote quanto atualmente. Segundo a Fenabrave, o índice chegou a 44,5%. Ou seja: quase metade dos carros vendidos no Brasil não tem a tradicional mesa de negociação, na qual o vendedor da concessionária serve aquele cafezinho quente ou aquele chá gelado para a família que foi lá para comprar um automóvel novo. Nada das negociações entre o marido e a mulher, os palpites dos filhos e, claro, as dicas do próprio vendedor.
Agora a negociação é fria, entre fabricante e frotista. No cálculo, a percepção de conforto, a relação peso/potência ou até mesmo aquele detalhe de design ou acabamento são absolutamente desprezados. Alguns até consideram certos itens, quando se trata de vendas para taxistas, VIPs ou governos (municipais, estaduais ou federal). A maioria dos carros, entretanto, é comprada pelas grandes locadoras, em lotes monumentais. Claro que essas locadoras levam em conta algumas preferências do consumidor, mas o que decide a compra é apenas o preço e o valor que o carro deixará ao final de dois ou três anos de uso. Ou seja: o valor de revenda.
Isso muda tudo. Sempre existiu esse tipo de venda, mas nunca como hoje. Atualmente, as locadoras conseguem obter mais lucro do que os próprios fabricantes com alguns carros. A razão é simples: escala industrial. Produzindo mais, as peças são adquiridas com menor custo. Porém, nesse movimento, há carros que só dão lucro quando são vendidos diretamente para os consumidores comuns, as pessoas físicas, nas velhas e boas concessionárias.
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Mas também não basta analisar o ranking de vendas no varejo para determinar quais são os carros que realmente estão sendo comprados pelo público. É preciso analisar o ranking anual, todavia deve-se considerar também os últimos meses, tomando o cuidado de perceber se alguma grande promoção não influenciou no resultado de um mês específico.
Diante de todas essas variantes, eu digo que os carros mais vendidos atualmente no Brasil, para o cliente real, são os seguintes: Chevrolet Onix (140.893), Hyundai HB20 (81.197), Renault Kwid (64.389), Ford Ka (59.620), Chevrolet Onix Plus (54.589*), VW Polo (53.620), Fiat Argo (50.964), Hyundai HR-V (45.574), Toyota Corolla (41.434) e Fiat Mobi (35.515. *O total refere-se aos 39.830 do Prisma e aos 14.759 do Onix Plus, que o substituiu.
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Esses são os verdadeiros carros mais vendidos do Brasil, os verdadeiros campeões de venda. O resto é resultado de estratégias industriais das montadoras combinadas com os desejos de lucros das locadoras. Nada mais distante do que o Brasil real, no qual o consumidor valoriza cada centavo investido num automóvel que vai depreciar rapidamente, mas também considera itens como potência, consumo, conectividade, conforto, segurança, praticidade, design, paixão pela marca e, obviamente, a relação entre o valor do carro e o tamanho do próprio bolso.