Akio Toyoda é chairman da Toyota desde 2009
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Akio Toyoda é chairman da Toyota desde 2009

 O presidente da Toyota, Akio Toyoda, voltou a questionar publicamente a transição acelerada para veículos elétricos, alegando que estes são mais poluentes que os híbridos. Em declarações recentes, o executivo afirmou que "um único veículo elétrico é tão sujo quanto três híbridos", baseando sua argumentação na matriz energética do Japão e no impacto da produção de baterias.

O argumento da Toyota

Toyoda, neto do fundador da empresa, argumenta que a Toyota vendeu cerca de 27 milhões de híbridos desde o lançamento do primeiro Prius em 1997. Segundo ele, esses veículos tiveram a mesma pegada de carbono que 9 milhões de carros totalmente elétricos, considerando a produção de baterias e veículos.

Toyota Prius 2023
Divulgação/Toyota
Toyota Prius 2023

O presidente da Toyota mantém há anos a posição de que "forçar" todos a comprarem veículos elétricos não é o caminho correto. Ele defende que a transição é um risco para milhões de empregos na cadeia automotiva.

A realidade dos números globais

Entretanto, análises técnicas contradizem as alegações de Toyoda. Estudos baseados em dados de agências internacionais demonstram que, mesmo nas piores condições de matriz energética, os veículos elétricos são significativamente menos poluentes.

Para uma comparação global com dados de 2023/2024, analisamos as emissões de CO₂ "do poço à roda" (da produção da energia ao uso do carro) para um sedã médio.

Sedã a gasolina: 221 gCO₂/km
Sedã elétrico:

  • Em matriz "suja" (média global): 108 gCO₂/km
  • Em matriz "limpa" (média da União Europeia): 49 gCO₂/km

Mesmo abastecido pela matriz energética média mundial (ainda muito dependente de combustíveis fósseis), o carro elétrico já polui cerca de 51% menos que o similar a gasolina.

Em redes elétricas mais limpas, como a da União Europeia, a vantagem do elétrico sobre o carro a combustão chega a 78%. No Brasil, esse valor é ainda maior, como veremos à frente.

Fontes: Agência Internacional de Energia (IEA), Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) e Agência Europeia do Meio Ambiente (EEA)

E quanto à produção das baterias?

A fabricação de baterias é um dos principais fatores que gera emissões de CO₂ na produção de carros elétricos. Para fabricar uma bateria de 92 kWh, são emitidas aproximadamente 9,2 toneladas de CO₂.

Baterias BYD
Divulgação
Baterias BYD

Porém, essa "dívida" ambiental é rapidamente compensada, à medida que os carros elétricos rodam sem emitir poluentes. Um levantamento feito pelo portal britânico CarbonBrief mostra que, mesmo em países onde a geração de energia elétrica é “suja”, as baterias são “pagas” em até dois anos.

Em matriz energética suja: após 43.300 km (cerca de 2 anos de uso médio brasileiro)

Em matriz energética limpa: após 30.800 km (aproximadamente 1,5 ano)

Após esse período, cada quilômetro rodado representa um ganho líquido para o meio ambiente.

Emissões no Brasil

O Brasil possui uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, com 88% da eletricidade vinda de fontes renováveis (principalmente hidrelétricas, eólicas e solares) em 2024, segundo o Balanço Energético Nacional (BEN). Isso torna os veículos elétricos ainda mais vantajosos ambientalmente no país.

Para calcular a poluição gerada por carros elétricos em movimento, cruzamos dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) sobre a matriz energética brasileira e do INMETRO sobre o consumo de energia dos carros elétricos. Para os a combustão, utilizamos um estudo do ICCT (International Council on Clean Transportation) de 2023.

Considerando emissões de CO₂ de toda a cadeia de produção até a circulação dos automóveis, no Brasil, os carros elétricos possuem uma pegada de carbono drasticamente menor:

Carros elétricos: 7 gCO₂/km

Carros a etanol: 35 gCO₂/km

Carros a gasolina: 117 gCO₂/km

Volume de emissões é 16 vezes maior nos carros a combustão, em relação aos elétricos
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Volume de emissões é 16 vezes maior nos carros a combustão, em relação aos elétricos


Por que os elétricos são mais eficientes?

A diferença fundamental está na eficiência energética dos motores:

Motores a combustão: aproveitam, no máximo, 30% da energia do combustível

Motores elétricos: convertem até 77% da energia elétrica em movimento

Isso ocorre porque os motores a combustão gastam 70% da energia disponível em forma de calor, ruído e fumaça.

Motor a combustão (esquerda) tem eficiência energética muito inferior à do elétrico (direita)
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Motor a combustão (esquerda) tem eficiência energética muito inferior à do elétrico (direita)

Essa vantagem técnica explica por que, mesmo em regiões com matrizes energéticas menos limpas, os veículos elétricos mantêm superioridade ambiental. Conforme as matrizes elétricas ao redor do mundo se tornarem mais limpas, a vantagem ambiental dos EVs só vai aumentar.

Fonte: DOE (Departamento de Energia dos EUA)   

Tendência mundial de descarbonização

Enquanto Toyoda baseia seus argumentos na matriz energética atual do Japão, ignora a tendência global de descarbonização. Países ao redor do mundo estão substituindo usinas a carvão por gás natural e renováveis, tornando os veículos elétricos progressivamente mais limpos.

Posição da indústria

Apesar das críticas de Toyoda, a própria Toyota tem investido em veículos elétricos e planeja lançar novos modelos nos próximos anos. A empresa reconhece que, embora mantenha foco em híbridos, precisa diversificar seu portfólio para atender diferentes mercados e regulamentações ambientais.

Conclusão

Os dados científicos são categóricos: veículos elétricos são ambientalmente superiores aos híbridos e carros a combustão, mesmo considerando a produção de baterias e matrizes energéticas sujas. A alegação do chairman da Toyota de que "um elétrico polui como três híbridos" não encontra respaldo em evidência científica.

Discurso de Akio Toyoda não condiz com os dados de diversas agências internacionais
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Discurso de Akio Toyoda não condiz com os dados de diversas agências internacionais

No contexto brasileiro, com nossa matriz energética predominantemente renovável, a vantagem ambiental dos veículos elétricos é ainda maior, tornando-os uma opção claramente superior do ponto de vista das emissões de carbono.

Embora a Toyota continue liderando as vendas globais com sua estratégia focada em híbridos, a ciência contradiz claramente o discurso de seu presidente sobre a superioridade ambiental dos híbridos frente aos veículos elétricos.

...

A transição para veículos elétricos envolve desafios complexos de infraestrutura, custos e cadeia de suprimentos, mas do ponto de vista estritamente ambiental, os números não mentem: elétricos são mais limpos.

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