A Ford Maverick inaugurou o segmento de picapes híbridas no nosso mercado. Vendida pelos mesmos R$ 244.890 pedidos pela versão FX4 2.0 turbo a gasolina , a opção ecológica me levou a dúvida: desempenho esportivo ou economia de 1.0?
Dúvida dura, devo dizer. O diabinho, que fala baixo, suspira ao pé do meu ouvido e tenta me convencer que a junção do 2.0 e tração integral é a chave da diversão pecaminosa . Ao mesmo tempo, um anjinho diz para eu ser mais frugal e me importar com o meio ambiente. Em suma, vai depender de mim.
O lado racional tem suas vantagens. A nova Maverick híbrida é uma picape e tanto em termos de trem de força. Como é de praxe nos híbridos convencionais, há dois tipos de motores. O 2.5 16V a gasolina e o propulsor elétrico geram, juntos, 194 cv e 21,4 kgfm a 4.000 rpm , sendo ambos regidos por um câmbio automático CVT planetário , uma solução incomum que dispensa as polias. O ciclo de combustão é o Atkinson , método mais eficiente que o tradicional ciclo Otto.
Quanto aos números de desempenho, peço que espere, pois tenho que falar de economia antes. São 15,7 km/l na cidade e 13,6 km/l na estrada, uma média de 14,6 km/l de gasolina. Não chega a ser um
Renault Kwid
, mas é consumo digno de outros "populares" 1.0.
Os pneus 225/60 R18 de baixa resistência ao rolamento ajudam.
O desempenho não deixa de ser bom. De acordo com a Ford, são necessários 8,7 segundos para chegar aos 100 km/h, enquanto a retomada de 80 a 120 km/h leva 6 s redondos. São números equivalentes aos do Volkswagen Polo GTS
. A velocidade máxima é limitada a 175 km/h, a mesma em toda a gama.
Como não tem cardã para passar a força para as rodas traseiras, o peso da híbrida é de 1.700 kg, 44 kg a menos que a Maverick puramente a combustão
, o que favorece o desempenho. A diferença de peso ajudou a ampliar a capacidade de carga da nova opção: são 659 kg, 42 kg extras.
Até aí, tudo certo. Só que isso não apaga o brilho da Maverick 2.0 turbo . Além de ter tração integral, sempre uma garantia de maior aderência e fôlego no fora de estrada, ela conta com 253 cv e 38,7 kgfm a apenas 3.000 rpm, rendimento que é administrado pela caixa automática de oito marchas. A arrancada de zero a 100 km/h é vencida em 7,2 s, sendo apenas dois décimos mais lenta do que a do último Volkswagen Golf GTI vendido - e produzido - no Brasil. Os VWs esportivos só ganham mesmo na velocidade máxima.
Por outro lado, o diabinho vai ter que esperar por um milagre na hora de abastecer. No caso da 2.0 turbo, são 8,8 km/l no ciclo urbano e 11,1 km/l no rodoviário, o que dá a média de 9,95 km/l de gasolina
. Mesmo com tanque de 67 litros, contra 57 l, a configuração convencional chega a 666 km de autonomia mista - já que falei no tinhosinho. Já a Maverick híbrida faz 832 km
, de acordo com os dados oficiais. É quase divino.
Em termos de design, mudam as rodas e o emblema traseiro . Não há nem sequer um logotipo nas imitações de saída de ar dos para-lamas. Uma ausência também entrega que essa é uma Maverick mais urbana: os ganchos para reboque, detalhes que estão na mais aventureira FX4.
Por dentro, o painel digital de 6,5 polegadas tem mostradores diferentes
, com um indicador de uso de potência e recarga no lugar do conta-giros.
É na parte mecânica que elas se diferenciam mais. O uso de tração dianteira não é o único downgrade, sem ela, foi-se também a suspensão traseira multilink, uma solução mais sofisticada do que o simples eixo de torção da Maverick híbrida . O circuito de testes até um resort no interior de São Paulo não contou com curvas e imperfeições capazes de testar o compromisso entre estabilidade e conforto do arranjo, infelizmente.
Como as baterias ficam instaladas na parte de baixo do carro - o pack é protegido contra impactos -, a cabine não teve suas dimensões reduzidas. Apenas interferiu no tamanho do porta-objetos embaixo do banco traseiro, que passou a ser de 58 litros - eram 73 l. Mas a caçamba diminuiu de 943 l para 938 l, exatamente um litro a mais que a Fiat Toro.
São 3,07 metros de entre-eixos, o que permite amplitude para quatro adultos altos, no que ajuda o túnel central baixo.
Os modos de direção também mudam. São eles Eco, Esportivo, Escorregadio e Reboque
, nada de Lama ou Terra/Areia
, opções que estão presentes na Maverick FX4
de tração integral permanente . Falando em terrenos, a versão híbrida tem 21,1 centímetros de distância ao solo.
Devo dizer que eu andei mais tempo no Eco e Esporte
. Conforme você já deve ter deduzido, o primeiro prioriza a eficiência, reduzindo as respostas do acelerador e mudando o funcionamento do ar-condicionado. Por sua vez, o segundo apressa as coisas, deixa o acelerador mais agressivo e, para completar, endurece um pouco a assistência da direção.
Na opção mais sedada, a Maverick s e torna um veículo dócil, com aceleração progressiva e retomadas tranquilas. Entre cidade e estrada, foi possível passar dos 16 ou 17 km/l com facilidade.
Já o Esporte dá pressa ao modelo. As acelerações são bem mais empolgantes e a direção fica firme, embora a sensação de centro de volante e as reações nas mudanças de trajetória sejam boas em qualquer modo.
Nas manobras de trânsito, o uso de pequenos espelhos convexos nas pontas dos retrovisores externos pode aumentar o campo de visão, mas engana em relação ao quão próximo estão os objetos. Sensores de ponto cego fazem falta.
A Maverick híbrida
não dispensa nenhum equipamento da versão a combustão pura. Estão lá o ar-condicionado digital de duas zonas, banco do motorista com ajustes elétricos, revestimentos de couro, central multimídia de oito polegadas, sistema de frenagem automática, aplicativo capaz de acionar várias funções remotamente
, enfim, uma lista razoável.
Mas tem horas que os lados racional e emotivo reclamam das mesmas coisas. Não há sensores de estacionamento traseiros, algo que não apenas deveria vir de série, como também os dianteiros. Conectar o Android Auto ou Apple CarPlay exige fios e também não há carregador de smartphones por indução.
Os acabamentos apostam mais em plástico rígido
do que qualquer outra coisa, dispensando enxertos nos painéis de porta, o que forma um contraste com os belos bancos revestidos de couro preto e marrom.
Os passageiros de trás podem não ter o que reclamar quanto ao espaço ou do fato de terem duas saídas (USB A e C) - há duas na dianteira -, mas devem sentir falta das saídas de ar-condicionado.
A maior ausência é notada em um capítulo que poderia ter sido resolvido com uma canetada. Disponíveis nos EUA, os pacotes de assistentes de direção englobam detector de ponto cego, alerta de saída de faixa com correção, controle de cruzeiro adaptativo - capaz de parar e seguir o trânsito (stop and go) -, assistente de evasão de colisão, sistema de diminuição de velocidade em descidas e sensores de ré traseiros, algo essencial para um carro com 5,07 m de comprimento e caçamba elevada, que não permite boa visibilidade para trás.
O fato é que um dos packs que incluem esses auxílios exige a adição do Luxury Package
, que traz som Bang & Olufsen
, carregador sem fio para celular, bancos e volante aquecidos, entre outros. Juntos, os três chegam a 4.010 dólares. Estamos falando de cerca de R$ 20 mil, isso sem incluir outros gastos decorrentes do acréscimo.
É sabido que isso aumentaria e muito o custo da picape, mas seria um diferencial que justificaria o preço maior em relação aos concorrentes, em especial, a Fiat Toro , que custa R$ 226.890 e tem motor a diesel, mas conta com menos espaço para pessoas.
A Ford focou nos modelos a diesel da Stellantis na apresentação da Maverick híbrida, chegando a incluir o Jeep Compass
na lista. É fato que eles são menos eficientes e perdem em certos quesitos, no entanto, não devem alguns desses equipamentos. De qualquer forma, adicionar tudo a deixaria ainda mais isolada em um segmento que está próximo de receber a mais dura concorrência de todas: a Ram Rampage.
E com qual das Mavericks eu ficaria? Talvez com a Hybrid
mesmo, afinal, é ela que se destaca por ser a única híbrida do segmento. Seu desempenho é adequado, o preço é o mesmo da versão FX4 2.0 turbo
e, por último, a economia é elogiável.
Ficha técnica
Motor: 2.448 cm3, dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, injeção direta, 194 cv (rpm não informado), 21,4 kgfm a 4.000 rpm, gasolina
Câmbio: automático CVT, tração dianteira
Direção: elétrica
Suspensão: McPherson na dianteira e eixo de torção traseira
Freios: discos ventilados na dianteira e traseira
Pneus: 225/60 R18
Peso: 1.700 kg
Dimensões: 5,07 metros de comprimento; 2,13 m de largura (1,84 m sem espelhos); 1,73 m de altura; 3,07 m de distância entre-eixos; tanque de 57 litros