A General Motors é líder do mercado brasileiro há três anos. Pelas projeções feita pela República do Automóvel, só a família Onix/Prisma representou um faturamento de R$ 14,6 bilhões no ano passado. Com uma margem de 10%, esses dois carros da Chevrolet deixariam nos cofres da GM algo como R$ 1,46 bilhão. Ou R$ 730 milhões com um resultado operacional de 5%. Acontece que, hoje em dia, os investimentos na indústria automobilística para as vendas da GM se manterem competitivas são altíssimos – e a montadora reclama dos prejuízos, apesar da liderança.
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Se apenas a GM reclamou, podemos supor que outras montadoras estejam tendo lucros. Os dois maiores concorrentes da GM no Brasil são a FCA (Fiat Chrysler Automobiles) e a Volkswagen. Das três empresas, a que mais soube tirar proveito da onda dos SUVs no mercado brasileiro foi a FCA, que lançou dois modelos lucrativos com a marca Jeep: o Renegade em 2015 e o Compass em 2016. Juntos, eles venderam mais de 106 mil unidades no ano passado, com ticket médio muito superior ao dos Chevrolet Onix/Prisma. A crise que vive a marca (apesar das boas vendas da GM ), portanto, também passa por suas escolhas, e não apenas pelo famoso custo Brasil.
Ainda este ano, mas somente a partir de dezembro, a GM começa a investir de fato no mercado de SUVs. Por enquanto, suas iniciativas foram a manutenção da produção do Trailblazer (um dinossauro que ainda utiliza carroceria sobre chassi) e a importação do Trax mexicano (vendido aqui como Chevrolet Tracker , mas que está defasado perante a concorrência) e do ótimo Equinox canadense (mas ele é muito caro para fazer volume). Em dezembro, a fábrica de São Caetano do Sul (SP) começa a produzir o novo Tracker, maior, mais moderno e que terá condições de competir diretamente com o Jeep Compass. Porém, não haverá um concorrente para o pequeno VW T-Cross, que estreia em breve.
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Quanto à vitoriosa dupla Onix/Prisma , a nova geração começa a ser feita em Gravataí (RS) ainda no final deste primeiro semestre. Maior, com entre-eixos de 2,61 metros, o novo Prisma poderá fazer frente ao Volkswagen Virtus, que passou a dominar um segmento que era totalmente do Chevrolet Cobalt. Aliás, o Cobalt foi uma solução genial da GM quando muitas famílias brasileiras migraram das classes D/E para a classe C e queriam um carro familiar novo e acessível. Agora, com o mercado retraído e o povão sem dinheiro, o futuro do Cobalt passa a ser incerto. Quanto à perua Spin (vendida como monovolume), é a única opção do mercado para o Honda Fit. Menor, o Fit vende 27 mil unidades/ano; o Spin vende 25 mil.
Novidades para ajudar nas vendas da GM
A chegada da nova geração da dupla Onix/Prisma não aposentará atual. Manter a geração antiga junto com a nova foi uma prática muito comum nos anos 1990 e 2000, mas já foi abandonada pela Volkswagen, pela Fiat e pela Ford. A Chevrolet insiste nessa solução e os atuais Onix/Prisma passarão a se chamar apenas Joy (nome usado pela versão de entrada desde o facelift de dois anos atrás). É uma aposta arriscada para um público cada vez mais exigente. Se bem que o sucesso comercial do Renault Kwid revela que a combinação preço/design/proposta pode ser mais vitoriosa do que a trinca qualidade/segurança/eficiência (caso do VW Up).
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No segmento de carros médios, a GM de fato enfrenta um drama. O ótimo Cruze, que vem da Argentina com visual moderno, multimídia completa e motor turbo eficiente, atua justamente nas duas categorias mais complicadas para a indústria. O Cruze sedã disputa contra o imbatível Toyota Corolla e não consegue sequer fazer frente ao Honda Civic. Vai longe o tempo em que os sedãs da Chevrolet davam banho nessa categoria, com os modelos Monza, Opala e Vectra. Nem vale a pena investir muito num sedã médio porque a participação dessa categoria caiu de 8,3% para 6,8% em apenas um ano. E isso é ruim para os cofres da GM, pois o Cruze deixa margem maior do que Onix/Prisma.
Já o Cruze Sport6, o hatch, obteve a famosa “vitória de Pirro” em sua categoria. Venceu, mas sua vitória não significou nada, pois vendeu apenas 5,5 mil unidades no ano inteiro. Para dar uma ideia, o VW Golf (segundo colocado) se transformou num carro de nicho e o Ford Focus (terceiro) vai sair de linha. É uma pena, pois essa categoria reúne os melhores carros do Brasil, com grande racionalidade, design atraente e ótima dirigibilidade – só que ninguém mais compra. E assim eles vão se tornando cada vez mais caros.
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Voltando aos SUVs, a GM ainda tem que resolver a questão do Trailblazer (e, por extensão, da picape S10). Como dissemos, o Trailblazer parou no tempo e já tem uma empolgante geração nova fabricada no México, baseada no Camaro e com o velho nome Blazer, de visual espetacular e com muito mais espaço do que o famoso esportivo. Ele pode até ser importado, mas não resolverá o problema, pois será muito caro. Porém, no Brasil, o Trailblazer despencou para o 23º lugar, com cerca de 3.800 vendas/ano. A picape S10 é feita na mesma plataforma e também está num segmento muito competitivo – daí a preocupação da GM com o próximo ciclo de investimentos. A S10 ainda é bastante competitiva, mas está atrás da Fiat Toro e da Toyota Hilux no ranking de picapes médias.
A Toro, aliás, é outro exemplo de como a FCA teve uma visão mais audaciosa do que a GM no segmento de picapes. Na esteira da Renault Oroch, que nasceu baseada no Duster, a Toro surgiu da plataforma do Jeep Renegade e manteve a Fiat como dona das duas picapes mais vendidas do país (além da Toro, a líder Strada, derivada do Palio). Ambas utilizam carroceria monobloco. Se para a FCA o fato de a Strada ser derivada de um Palio fora de linha não incomoda tanto (afinal, ela é líder), para a GM pesa o fato de a pequena Montana ser derivada do Chevrolet Agile (também aposentado), pois suas vendas estacionaram em 13 mil unidades/ano (três vezes menos do que a VW Saveiro, sua rival mais próxima).
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Em resumo, as vendas da GM devem seguir disputando com a FCA (e cada vez mais também com a Volkswagen) a liderança do mercado automotivo brasileiro com a renovação da família Onix/Prisma e a nacionalização do Tracker, porém no futuro realmente necessitará de novos investimentos em segmentos importantes, como o de picapes e de carros eletrificados. Por isso, organizar as contas será fundamental para continuar investindo no Brasil e manter o brilho que sempre teve na indústria automobilística de nosso país.