A Volkswagen Saveiro acabou de passar por mais um facelift , uma reforma que não pode ser chamada de meio de vida, uma vez que o modelo foi lançado originalmente em agosto de 2009. Já é conhecido o fato que a marca alemã tem outro projeto de picape para os próximos anos, então o retoque servirá para segurar um pouco mais o atual carro no mercado.
Mas isso não quer dizer que a Saveiro renovada será apenas um tampa buraco temporário. A VW mudou também a sua estratégia de preços para enfrentar a Fiat Strada no filão dos modelos voltados ao trabalho, sem se esquecer de criar uma versão mais voltada ao lazer, a Extreme, que substitui a antiga Cross.
Mais de 80% das vendas da picapinha são para pessoas jurídicas, então, eu vou concentrar a primeira avaliação na versão Robust, que tem carroceria cabine simples (R$ 95.770, R$ 1 mil a mais que antes) e cabine dupla (R$ 109.710, R$ 600 a mais).
Como uma boa picape no estilo "meu nome é trabalho", a Robust tem para-choques, retrovisores e maçanetas pintados de preto. Sem peças na cor da carroceria, a reforma frontal ficou até um pouco discreta ao ver o modelo pela primeira vez.
O pacote de reestilização inclui faróis com recortes diferentes, luzes de rodagem diurna halógenas, nova grade, para-choques com vincos mais agressivos e lanternas com novos elementos internos - poderiam ser de LEDs. Além disso, passaram a ser de série itens como controle de tração e de estabilidade e freios a disco .
Ninguém vai suar o uniforme dentro dela, pois a versão vem de série com ar-condicionado, direção hidráulica, travas e vidros elétricos . Em uma época em que a ergonomia é levada a sério no ambiente de trabalho, há também ajuste de altura do banco do motorista - o volante regulável não vem nesta configuração.
Para não danificar a ferramenta de trabalho, sensores de estacionamento traseiros e protetor de caçamba são de fábrica, além de controles de estabilidade e de tração com hill holder (assistente de partida em rampa). E o modelo traz ainda luzes de rodagem diurna, entrada USB no console , retrovisores com repetidores de seta, calotas escurecidas e preparação para som.
Um pacote de benefícios trabalhistas bem decente. Seria ainda melhor se houvesse uma estrutura mais moderna e segura, com airbags laterais e afins, algo que poderia entrar em discussão no sindicato. Seria injusto não lembrar que a Strada cabine dupla com quatro airbags marcou apenas uma estrela nos crash tests do Latin NCAP no ano passado , um resultado terrível.
A última vez que algum projeto da linha Gol foi testado foi em 2010, quando a segurança ganhou três estrelas para adultos e duas para crianças. O que isso significa? Nada, pois os protocolos do instituto de segurança se tornaram bem mais exigentes. É só ver que o Polo atual, um projeto muito mais moderno do que o Gol, com airbags laterais e estrutura bem mais moderna, conquistou somente três estrelas .
No quesito chão de fábrica, a Strada Endurance cabine simples (a Fiat usa um pequeno vidro traseiro lateral e, por isso, chama de Cabine Plus, mas não vamos entrar nisso) dispensa alguns desses itens, exemplo dos vidros e travas com acionamento elétrico e calotas, sem falar nos importantes discos traseiros. Por outro lado, traz outros não disponíveis na Robust, como o ajuste de altura do volante e o computador de bordo. Não tem jeito, os benefícios variam de uma empresa para a outra . A VW cabine dupla soma ainda bagageiro de teto, desembaçador do vidro traseiro e porta-celular no encosto do banco do carona.
Só que o modelo da marca italiana fica para trás em um dos pontos mais importantes: o preço, pois custa R$ 100.990, R$ 5.220 a mais, o que dá um belíssimo décimo terceiro .
Após bater o ponto, entrei na picape e logo me adaptei ao ambiente de trabalho. Eu dirigi um Gol Power 1.6 2009 por muitos e muitos anos, logo, estou habituado ao serviço.
Ao contrário do saudoso Golzinho, não há ajuste de altura e distância do volante ou o velho toca CDs com mp3 de frente destacável, que faz falta, a despeito de ser velhinho, pois há apenas preparação de som. Aproveitei para conversar com o jornalista ao meu lado na viagem de bate e volta até o interior de São Paulo.
O acabamento é simples, não há extensão do console e volante multifuncional, tampouco chave com botões para acionamento das travas. Uma nova régua texturizada percorrendo o painel uma única novidade. Alguns itens podem ser adquiridos como acessórios, exemplo do próprio sistema de som. Encontramos algumas rebarbas, exemplo de uma junto à alavanca de seta .
Depois de andar em tantos carros mais recentes da VW, o peso e sensação da direção hidráulica é um contraste em comparação aos sistemas de assistência mais modernos da marca - a Strada básica adotou a elétrica somente agora, quando a linha 2024 dispensou o antigo motor 1.4 Fire. O maior problema nem é tanto a questão da rigidez, o que pega é o amplo diâmetro de giro de 12,3 metros - a rival da Fiat faz o giro completo em 10,8 m e até mesmo a Toro precisa de 12,2 m.
O câmbio manual já foi referência e continua sendo agradável, mas é barulhento para o padrão atual, embora seja melhor em precisão do que o conjunto da Strada.
É engraçado testar um modelo com muitos anos de estrada, é quase que inevitável confrontar a experiência do presente com a memória. Uma coisa que me chamou a atenção foi a tocada do motor EA211 1.6 16V. Eu sempre vou lembrar um dos primeiros VWs que dirigi com esse propulsor: a Saveiro Cross 2014 . Era um propulsor impressionante, rápido e liso em rotações mais altas, uma mudança e tanto em relação ao antigo EA111 1.6 8V.
No entanto, ele me pareceu um pouco mais amarrado após dirigir uns bons quilômetros com a Saveiro renovada. Não foi a minha memória que me enganou: nas picapes posteriores, o 16 válvulas teve a potência e torques reduzidos. Se antes gerava 120/110 cv a 5.750 rpm e 16,8/15,8 kgfm a 4.000 rpm, ele passou a entregar 116/106 cv e 16,1/15,4 kgfm - nos mesmos regimes. Os limites de emissões mudaram e, com eles, o rendimento dos propulsores.
De qualquer forma, ainda é bem melhor do que o 1.3 da Strada - se a comparação fosse com o antigo 1.4 da Fiat, a sensação de superioridade seria maior. Segundo a VW, a aceleração de zero a 100 km/h leva 9,9/10,4 segundos , enquanto a velocidade máxima é de 181/176 km/h (etanol/gasolina).
Há uma vantagem grande em relação ao 1.3 de 107/98 cv e 13,6/13,1 kgfm de Strada Endurance, que vai de zero a 100 km/h em 11,6/12,5 s e chega aos 171/166 km/h (etanol/gasolina) .
Deixando a emoção de lado e colocando a calculadora no lugar do coração, o consumo da VW perde feio para o entregue pela rival. Com etanol, Saveiro Robust faz 7,9 km/l na cidade e 9,1 km/l na estrada, rendimento que sobe para 11,5 km/l e 12,9 km/l com gasolina nas mesmas situações. Já a Strada consegue 9,3/10 km/l de etanol (ciclo urbano/rodoviário) e 13,1/14,2 km/l de gasolina .
Voltando à direção, o equilíbrio dinâmico da plataforma PQ24 continua bom, a Saveiro aponta com segurança e tem comportamento previsível. Os competentes pneus Pirelli Cinturato P7 205/60 R15 ajudam. A suspensão traseira por eixo de torção também é outra aliada, mas toma um pouco de espaço na caçamba por usar torres para amortecedores - a Strada se vale de um antigo e resistente eixo rígido.
Desvios de direção e frenagens pesadas não a tiram do prumo facilmente. Em uma picape carregada, boa parte do peso pode ficar concentrado na traseira em uma frenagem, o que reforça ainda mais a necessidade de discos nas quatro rodas, além do fato do sobrepeso também acelerar o indesejado processo de fadiga nos freios.
Ao enfrentar um trecho fora de estrada com pedras e subidas, a tração foi moderada pelo controle eletrônico e a picapinha não perdeu o fôlego, tampouco raspou o piso. A VW elevou a suspensão dianteira em 1 cm, com altura livre do solo de 19,6 cm, contra 20,9 cm da Fiat . Por sua vez, o ângulo de entrada é de 23,8 graus e o de saída é de 27,6 graus, face 23,4/27,8 graus da Strada. Parece bobeira para quem vive e anda apenas por lugares asfaltados, mas não é.
Em termos de caçamba, a Saveiro cabine simples leva 924 litros e suporta (entre ocupantes, carga e afins) 664 kg, números que passam a ser de 580 l e 638 kg no caso da cabine dupla. Já a Strada cabine simples chega a 1.354 l e 720 kg e a dupla entrega 844 l e 650 kg. É uma funcionária de alta carga de trabalho.
Um outro ponto que a Robust perde é o fato da sua cabine dupla não ser quatro portas . A VW apresentou a configuração apenas com cabine simples, mas fui relembrar o acesso e espaço traseiro na Extreme. Embora seja possível levar três pessoas atrás, segundo a legislação, o fato é que adultos não têm conforto, tampouco entram com facilidade.
A Strada tem cabine dupla a partir da Freedom 1.3 de R$ 112.990, que custa R$ 3.280 a mais , mas traz as desejadas quatro portas e adiciona itens como vidros elétricos em todas e airbags laterais frontais.
No final, a sensação é de que a Saveiro Robust permanece sendo uma picape boa para trabalho. A Strada pode ter sido lançada em 2020, mas ela não foi feita sobre a mais sofisticada das plataformas, pois tem muito do Mobi e da geração anterior da própria picape. A questão é que pontos como consumo mais alto e espaço inferior podem ser vitais para alguns compradores. Levar menos carga e gastar mais combustível é algo que diminui a vantagem do custo de compra e/ou propriedade menor.
Ficha técnica - Saveiro Robust Cabine Simples
Motor: 1.598 cm3, dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, injeção eletrônica, flex, 116/106 cv a 5.750 rpm e 16,1/15,4 kgfm de torque a 4.000 rpm
Câmbio: manual de cinco marchas, tração dianteira
Direção: hidráulica, diâmetro de giro de 12,3 metros
Suspensão: McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira
Freios: discos ventilados na dianteira e discos sólidos na traseira
Pneus: 205/60 R15
Peso: 1.076 kg
Dimensões: 4,49 metros de comprimento; 1,72 m de largura (sem espelhos) e 1,89 m (com espelhos); 1,52 m de altura; 2,75 m de distância entre-eixos; tanque de combustível de 55 litros; caçamba de 942 litros; e capacidade de carga de 664 kg